Folha de S. Paulo


Mercado teme volta de política econômica do primeiro governo Dilma

Ao manifestar sua insatisfação sobre os cortes no Orçamento, o ministro Joaquim Levy (Fazenda) explicitou uma divisão no governo que levanta dúvidas no mercado sobre a disposição da presidente Dilma Rousseff em manter o roteiro no rearranjo da condução da economia.

Quando justificou a interlocutores o convite a um economista ortodoxo para comandar a economia, Dilma disse à época que seu objetivo era organizar seu segundo mandato em duas fases.

Pedro Ladeira/Folhapress
A presidente Dilma Rousseff e os ministros Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento)
A presidente Dilma Rousseff e os ministros Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento)

Dois primeiros anos de ajuste, ao estilo Levy, e os dois últimos de desenvolvimento, na linha defendida pelo economista Nelson Barbosa (Planejamento).

Agora, o receio de analistas e o desejo de petistas, que desencadearam uma temporada de pressões contra a política econômica, é que Dilma encurte o período de ajustes recessivos na economia e opte por iniciar uma flexibilização já no segundo semestre.

Levy, que desde sexta (22), data do anúncio do corte de R$ 69,9 bilhões, só falou por telefone com Barbosa, disse a interlocutores que segue com aval de Dilma.

Já o ministro do Planejamento, que defendia um corte abaixo dos R$ 70 bilhões, tem dito que não vai estimular disputas. Conhecidos de ambos contemporizam, dizendo que eles até brincaram sobre o tom dado pelo noticiário sobre a relação.

Os dois, contudo, encarnam estilos distintos na visão de colegas e aliados. Levy ganhou um carimbo que o incomoda, de tocar uma política de uma nota só, a do ajuste.

A interlocutores diz ter propostas para a segunda fase da economia, mais orientada para o investimento, mas diz que o país não chegará a ela se não fizer o dever de casa. Ele é criticado por não mostrar a "porta de saída" para a crise.

DESENVOLVIMENTISTA

Barbosa, egresso do primeiro mandato de Dilma, é visto como um aliado das políticas desenvolvimentistas mais ao feitio petista.

Não por outro motivo, Levy confidenciou a interlocutores não gostar do discurso de que o país começará a se recuperar no início do segundo semestre, mensagem dada por Barbosa na sexta.

No campo petista, está também o chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante –que, apesar de declarar apoio a Levy, não compartilha de suas convicções.

Apesar das nuances no debate sobre o ajuste, Dilma não dá sinais de que pretende abreviar a gestão Levy na Fazenda, embora Barbosa conte com o entusiasmo do ex-presidente Lula para assumir o comando da economia.

Mas mesmo uma saída de Levy não é garantia de que isso ocorra, segundo assessores presidenciais.

Levy está isolado. Além de Dilma, só conta com o apoio do presidente do BC, Alexandre Tombini. Nesta terça (26), o colega fez críticas duras à política econômica dos dois últimos anos (leia ao lado).

Se aprovado o ajuste, Levy crê que terá mais tranquilidade para tocar sua estratégia de consolidar a recuperação da credibilidade do governo.

O desafio é grande. A economia tende a desacelerar ainda mais no segundo trimestre, reduzindo a arrecadação e dificultando o cumprimento da meta de superavit de 1,1% do PIB em 2015.

Essa dificuldade, reconhecida por assessores de Levy, deve gerar o próximo embate encarnado nos titulares da Fazenda e do Planejamento.

No Congresso, PT e PMDB ensaiam aprovar uma emenda à LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2016 propondo reduzir a meta de superavit deste ano de 1,1% para 0,8%, ideia que tem a simpatia de setores do governo.

Levy não quer nem ouvir falar disso. Considera ser uma arma de quem deseja reduzir os cortes no Orçamento.


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