Folha de S. Paulo


Cresce procura por empresas especializadas em demissões no país

"Estamos fazendo uma reestruturação na empresa e a sua posição foi extinta. Precisaremos de outra estrutura funcional que vai absorver suas atividades. Agradecemos sua participação."

Variações desse discurso se tornaram um fantasma para milhares de trabalhadores brasileiros e um mantra na mente de executivos de empresas especializadas em demissões desde que a crise deflagrou a escalada do desemprego no país.

Enquanto a economia desacelera, corroendo o nível de ocupação, quem fatura são as firmas de "outplacement", aquelas especializadas no que chamam de "transição profissional" e também em demissão, termo menos eufemístico e mais adequado ao contexto atual.

O serviço é contratado por companhias que pretendem demitir um ou mais funcionários e buscam auxílio para elaborar a forma de informá-los da má notícia. Tais empresas também oferecem auxílio psicológico e orientam os demitidos sobre como procurar emprego por um período que pode chegar a um ano.

Quem escolhe os que serão dispensados e os avisa é o próprio empregador.

O objetivo é fazer "desligamentos menos traumáticos", segundo Marshal Raffa, diretor da Thomas Case, cujos contratos cresceram mais de 50% desde o início de 2014.

"É a demissão responsável", explica Raffa, usando palavras como "acolhimento" e "conscientização".

No momento atual, considerado por executivos de "outplacement" uma das piores ondas de demissões que já vivenciaram, os cortes envolvem redução de custo e busca de eficiência operacional.

As empresas estão fazendo demissões mais drásticas que na crise de 2009, segundo Rafael Souto, presidente-executivo da Produtive, que neste primeiro trimestre registrou alta de 25% em tais contratos ante igual período de 2014.

"O que preocupa é que estão cortando muito num momento em que há pouco se reclamava de falta de talentos. São talentos que elas demoraram para incorporar", diz.

No primeiro trimestre deste ano, 50,3 mil vagas foram fechadas. Em igual período de 2009, foram cortados 26,6 mil postos. A taxa de desemprego no país fechou o primeiro trimestre em 7,9%.

"Em outras crises havia menos empresas se reestruturando. Fusões e aquisições são um fator adicional que gera demissões. Arrisco dizer que este é um momento que nunca vimos", diz Lucia Costa, diretora da Stato, que teve alta de 22% nos contratos de transição de carreira.

Karime Xavier/Folhapress
Marshal Raffa, diretor da Thomas Case
Marshal Raffa, diretor da Thomas Case

GEORGE CLOONEY

A maior parte dos clientes do "outplacement" é formada por empresas de grande porte e multinacionais. Os custos sobem conforme o volume de vagas cortadas e os cargos que serão fechados.

"O benefício para a empresa é passar a quem fica a imagem de bom lugar para trabalhar e manter produtividade. Evita sabotagem e processos trabalhistas. Se um profissional sai de modo positivo, pode vir a ser um parceiro em uma empresa fornecedora ou cliente no futuro", diz Raffa, da Thomas Case.

Nos casos em que centenas de funcionários são dispensados, eles são separados em pequenos grupos.

Nas demissões em massa, a Thomas Case chega a levar equipe médica para atender reações como alteração de pressão e desmaios.

"Já vi muita gente chorando, de diferentes cargos, diretores em prantos. Há desde a negação até reações explosivas", conta Raffa

Ele evita, no entanto, se comparar ao personagem de George Clooney no filme "Amor Sem Escalas", que passa mais de 300 dias do ano viajando para demitir pessoas na crise de 2009.

"É preciso trabalhar a forma como o profissional vai fazer o comunicado à família. Discordo do modo como ele trata no filme. Acho muito frio", afirma o executivo.


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