Folha de S. Paulo


Grécia volta a crescer, mas crise é presente no dia a dia

Quando a crise econômica bateu de vez à porta da Grécia em 2010, Marianna Aretaki, hoje com 50 anos, tinha uma loja de médio porte para vender camisetas em Atenas. Focado nos moradores, o negócio rendia de € 2.500 a € 3.000 ao mês para ela, divorciada, sustentar os filhos.

A turbulência financeira piorou, os clientes sumiram e não deu outra: Marianna teve de fechar o negócio. No pacote, vendeu o carro e interrompeu o pagamento de € 800 mensais do financiamento da casa de € 250 mil.
Passou a vender os mesmos produtos numa barraca perto da Acrópole, o mais famoso ponto turístico grego, mas com uma renda bem menor, de € 300 mensais.

Ela e os dois filhos permanecem na mesma casa, apesar do calote -que diz ser definitivo- na prestação.

Leandro Colon/Folhapress
Marianna Aretaki, 50, e o filho, Alexander, 21, perto da Acrópole, em Atenas, onde vendem camisetas
Marianna Aretaki, 50, e o filho, Alexander, 21, perto da Acrópole, em Atenas, onde vendem camisetas

"Uma advogada conseguiu nos manter na casa porque, como é onde moramos, a Justiça nos protege e os bancos estão preocupados em cobrar de quem deve mais. E não tem ninguém para comprá-la."
Cinco anos depois de quase ir à bancarrota, a Grécia dá sinais tímidos de recuperação em meio à crise que abalou a Europa e levou o país a receber um socorro de € 240 bilhões do FMI (Fundo Monetário Internacional) e do BCE (Banco Central Europeu).

No segundo quadrimestre deste ano, saiu tecnicamente da recessão, com previsão de crescimento no ano entre 0,6% e 0,8% -os mais otimistas falam em 1% e projetam 2,5% para 2015.

"A Grécia está de volta", proclamou o primeiro-ministro, Antonis Samaras.

O boom do turismo -20 milhões de visitantes no ano- e o (ainda lento) crescimento do consumo são apontados como fatores somados à rígida austeridade fiscal.

Apesar dos números, porém, moradores da capital Atenas, como Marianna, nem têm muito o que celebrar.

O estrago na vida da população grega foi tão grande, que a "lição de casa" recomendada está longe do fim.

DESEMPREGO

O país pode estar retomando fôlego, mas ainda falta muito para devolver a mesma vida aos que sofreram e sofrem os reflexos da crise.

A taxa de desemprego continua a mais alta do bloco europeu, em torno de 26%. Cerca de 70% dos desempregados (1,3 milhão de pessoas) não conseguem ocupação há mais de um ano -muitos vagam pelas ruas de Atenas.

A dívida pública ronda os 175% do PIB (era de 129% em 2009) em um país cuja economia encolheu 25% nos últimos cinco anos.

"Assim como as famílias, empresas e o governo ainda estão tentando pagar dívidas, e os bancos estão rigorosos, deixando a atividade econômica ainda moderada mesmo com o crescimento retomado. Os benefícios [da retomada] ainda não atingem a população", diz o professor Ramon Pacheco, do departamento de estudos europeus do King's College (Londres).

Para ele, cabe à Grécia agora aplicar medidas de curto prazo que atinjam a população, como a criação de empregos no setor público, o combate à evasão fiscal e a atração de investimentos no turismo e no transporte.

"Medidas de longo prazo são úteis, mas não terão impacto imediato sobre a população, que é do que a Grécia precisa", ressalta.

É inegável, porém, que há alguns sinais de melhora.

"Nos dois primeiros anos da crise, as pessoas vinham aqui comprar só créditos para celulares. Isso começou a mudar: as pessoas estão trocando o telefone antigo", conta o paquistanês Zamir Ahmed, 42, funcionário de uma loja de telefones e há 20 anos em Atenas.

Além desse contexto, o país pode sofrer uma turbulência política nas próximas semanas que certamente vai respingar na sua economia.

O parlamento grego faz nesta segunda (29) a terceira e última tentativa de eleger o presidente do país, cargo meramente representativo, mas que depende da maioria de 3/5 dos votos para ser eleito -portanto, de coesão.

Se o candidato único lançado pelo premiê, Stavros Dimas, não obtiver os votos, o parlamento será dissolvido, e eleições gerais, convocadas.

Neste caso, o partido de esquerda radical Syriza, contrário às medidas de austeridade negociadas na União Europeia, é o favorito. Sua vitória pode ameaçar os acordos selados pela Grécia e azedar sua relação com o bloco.

Editoria de Arte/Folhapress

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