Folha de S. Paulo


Investidores devem ter cautela com ações de tecnologia dos EUA

Aqueles que acreditam verdadeiramente na duradoura alta do mercado de ações dos Estados Unidos, que contrariou os céticos e despertou preocupações quanto à possibilidade de uma nova bolha nas bolsas, têm por foco a liderança das companhias que "mudaram o jogo" na atual geração.

Entre as companhias vistas como tendo redefinido seus setores, Amazon e Google têm papel de destaque, acompanhadas por Facebook, Netflix, Tesla e muitas empresas menores que estão à beira de realizar perspectivas de ultracrescimento na biotecnologia, mídia social e Internet.

A propensão de alguns investidores a escolher ações de maior risco reflete a natureza tépida da economia norte-americana nos últimos anos. Diante desse cenário, os investidores preferem apostar pesado em companhias que estejam crescendo rápido ou, no caso da biotecnologia, possam estar à beira de uma transformação por efeito do desenvolvimento de um medicamento avançado.

"O mercado está interessado em empresas capazes de crescer independentemente da economia, e disposto a pagar múltiplos mais altos por elas", disse Robert Stimpson, da Oak Associates.

Depois de uma oscilação perceptível alguns meses atrás, muitas das chamadas "ações de ímpeto" se recuperaram, em meio a indicadores econômicos contraditórios, e a volatilidade subjacente se manteve muito baixa, o que ajudou a sustentar a alta do índice S&P 500.

O Índice de Biotecnologia da Nasdaq, por exemplo, mostra alta de 20% ante seu ponto de maior queda em abril, e a Netflix subiu em mais de 30% de abril para cá, enquanto a Gilead Sciences, Twitter, LinkedIn, Facebook e Tesla também subiram em cerca de 25% desde a onda de vendas sofrida no segundo trimestre.

Esse desempenho atraiu a atenção do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), que no começo deste mês alertou que os indicadores de avaliação de pequenas empresas de mídia social e biotecnologia "parecem substancialmente distendidos" apesar da notável desaceleração nos preços das ações desses setores mais cedo este ano.

Steve Weeple, da Standard Life Investments, disse que o Fed tocou em um ponto importante sobre o aumento nos valores de avaliação das pequenas empresas de mídia social e biotecnologia: a importância de ser diligente na seleção de ações.

"Quando o sucesso de companhias fortes se filtra para empresas menores que ainda não apresentaram resultados, os investidores precisam de cautela", diz Weeple. No caso do Facebook, ele diz que eles se impressionam com a capacidade da companhia para monetizar oportunidades de publicidade sem deturpar seu propósito como veículo de mídia social.

Os resultados de faturamento fortemente positivos do Facebook e da Gilead, na semana passada, serviram para sublinhar que a questão da avaliação é secundária, para grupos na fronteira do crescimento.

"Depender das avaliações como base para uma decisão de compra de ações de companhias que estão a caminho de redefinir um setor não é a abordagem correta", diz Dan Greenhaus, estrategista chefe da BTIG.

"Os investidores deveriam avaliar suas perspectivas de crescimento. Essa é a diferença entre uma Tesla e a GE". E as perspectivas continuam a ser fortemente atraentes, desse ponto de vista.

Adam Parker e sua equipe no Morgan Stanley afirmam que as estimativas de receita para o ano que vem sugerem que tecnologia, Internet e software serão provavelmente os três setores de mais rápido crescimento.

"Assim, por um lado, administrar um portfólio sem exposição a tendências como computação em nuvem, big data e análises de dados parece imprudente. Por outro lado, os ritmos acelerados de crescimento de muitas dessas ações já são um componente dos preços atuais".

Determinar se essas companhias devem subir ainda mais ou passar por consolidação que propiciará novos retornos, especialmente se a economia se acelerar para crescimento anual superior aos 3%, é a questão. Em um cenário como esse, os investidores deveriam abandonar as ações de ímpeto e trocá-las pelas cíclicas. No entanto, a economia mais ampla continua a ser uma grande incógnita.

"Existe um argumento legítimo no sentido de que o final do relaxamento quantitativo trará crescimento mais baixo", diz Stimpson. "Os nomes da mídia social são todos caros. Isso é um indicador de que as companhias de bom crescimento são avaliadas com ágio em períodos nos quais crescimento é difícil de obter".

Desde que a economia continue a crescer, ainda que aos solavancos, e os números da volatilidade subjacente continuem perto de recordes de baixa, apostar nas ações de companhias em crescimento parece ter empuxo como estratégia dominante nos Estados Unidos.

Russ Koesterich, da BlackRock, diz que depender das ações de ímpeto como estratégia só funciona se a volatilidade estiver sob controle. "Essas ações podem subir mais, apesar das avaliações distendidas, enquanto a volatilidade se mantiver baixa".

Para alguns investidores, porém, deixar de lado o empuxo final de crescimento pode ser prudente, porque eles esperam que a economia ganhe força.

Richard Madigan, do JPMorgan Private Bank, diz que vendeu as ações de ímpeto que detinha no final do ano passado, antecipando maior crescimento para a economia dos Estados Unidos este ano.

Koesterich acrescenta: "Em um mundo no qual avaliações distendidas fazem com que as ações dependam do dinheiro barato do Fed, continuaremos a enfatizar uma parcialidade pelo valor".

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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