Folha de S. Paulo


Governo brasileiro diz que decisão sobre dívida da Argentina é 'irracional'

O governo brasileiro fez uma dura defesa da Argentina na ONU, nesta quarta-feira (25), dizendo que a decisão "irracional" do Judiciário americano que obriga o vizinho a pagar os credores em 30 de junho chancela um "comportamento irresponsável, especulativo e moralmente questionável" dos fundos de investimento.

Segundo o embaixador brasileiro na ONU, Antonio Patriota, é preciso acompanhar "com cuidado" os impactos desta situação para a comunidade internacional.

As declarações foram feitas após a fala do ministro da Economia argentino, Alex Kicillof, durante uma reunião do G77 (países em desenvolvimento) nas Nações Unidas.

"O que este caso ilustra é que um comportamento irresponsável, especulativo e moralmente questionável, com impactos tanto econômicos como sociais para um país e impactos destrutivos e sistêmicos para a arquitetura financeira internacional pode ser perfeitamente legal", disse Patriota.

Em 2005 e em 2010, a Argentina procurou os detentores dos títulos e ofereceu valores menores e novos prazos de pagamento. A maioria deles –que tinha 92% dos papéis– aceitou os termos, o que significava receber menos. No entanto, os que detinham 8% não concordaram com os termos propostos pelo governo.

De acordo com a decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos, de 16 de junho, o país tem que pagar US$ 1,3 bilhão aos credores que não aceitaram a reestruturação da dívida. O pagamento deve ocorrer até 30 de junho, quando o governo precisa pagar mais uma parcela do débito para os credores que aceitaram a reestruturação.

Na segunda-feira (23), o governo argentino pediu que o juiz Thomas Griesa, responsável pela causa, suspenda a sentença, em uma tentativa de conseguir mais tempo para negociar com seus credores.

APOIO LATINO

O embaixador reforçou o apoio do Brasil e de grupos da região, como Mercosul e Celac, à Argentina, e pediu um trabalho mais coordenado da comunidade internacional para discutir o tema de reestruturação da dívida.

Outros membros do G77, como Colômbia, Cuba, Índia e Equador, também demonstraram seu apoio ao governo argentino.

Editoria de Arte/Folhapress

CONDIÇÕES "COMPLEXAS"

Na ONU, Kicillof, acompanhado do chanceler argentino Héctor Timerman, explicou aos embaixadores dos países em desenvolvimento o histórico da dívida e disse que as decisões da Suprema Corte e do juiz americano Thomas Griesa estão "empurrando [o país] para um default [calote] técnico".

"Se de hoje a segunda que vem, o juiz não estabelecer um guarda-chuva legal, não suspender essa sentença, a negociação se dará em situações muito complexas", disse o ministro.

"Em todos os caminhos, essa sentença empurra a Argentina a uma crise econômica."

Visivelmente emocionado, o chanceler argentino agradeceu o apoio dos países em desenvolvimento.

IMPACTO

"As decisões que se tomam nos escritórios confortáveis de banco e de advogados de Nova York, de Londres, têm um impacto nas zonas mais pobres de Bolívia, de Chile, de Argentina, do Paquistão. Têm efeito sobre a saúde e a educação do nosso povo", disse Timerman, destacando que o papel dos governantes desses países é não deixar que seu povo seja "vítima" dessas decisões.

Ambos os ministros, contudo, reafirmaram, por várias vezes, que o país está disposto a pagar a dívida com os fundos "abutres".

Kicillof não deixou claro se terá algum encontro com os representantes dos credores que não aceitaram reestruturar sua dívida durante a passagem por Nova York.

O mediador designado por Griesa, Daniel A. Pollack, informou por nota, no entanto, ter se encontrado, "por muitas horas" com representantes das duas partes na terça-feira (24).

"Nenhuma solução foi alcançada. As partes, por meio de seus representantes, concordaram em manter o conteúdo das discussões confidencial para facilitar a possibilidade de uma solução futura", disse Pollack.


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