Folha de S. Paulo


Cotas para mulheres em cargos mais altos têm efeito limitado, diz estudo

Uma das questões mais complicadas no mundo dos negócios é como elevar a representatividade das mulheres nos escalões mais altos das empresas.

Uma ideia cada vez mais popular na Europa é a da ação afirmativa para cargos executivos –normas que determinam que as companhias tenham certa porcentagem de mulheres nos seus postos de comando, especialmente como integrantes do conselho.

A tese central é que melhorar a situação no topo provavelmente vai gerar um efeito cascata para os escalões inferiores, melhorando os salários e a representatividade delas em outros cargos.

Rebecca Cook/Reuters
Mary Barra, presidente da GM e executiva mais poderosa do mundo, segundo a
Mary Barra, presidente da GM e executiva mais poderosa do mundo, segundo a "Forbes"

A Noruega aprovou em 2003 uma lei que exige que as empresas de capital aberto tenham pelo menos 40% de mulheres em seus conselhos. Muitos países, entre os quais Espanha, Finlândia, França, Islândia e Itália, seguiram o mesmo caminho.

Há pessoas propondo cotas semelhantes nos Estados Unidos. Em abril, algumas corporações americanas, entre as quais Bloomberg, DuPont e Deloitte, abriram uma unidade norte-americana do 30% Club, grupo criado no Reino Unido por empresas que se comprometem voluntariamente a dedicar ao menos 30% dos assentos do conselho para executivas.

O mais abrangente estudo realizado até agora sobre o tema, sob a liderança de Marianne Bertrand, da Universidade de Chicago, demonstra que, ao menos no curto prazo, esse tipo de medida teve pouco efeito além do óbvio -ou seja, colocar mais mulheres nos conselhos.

Na Noruega, as cotas não geraram um aumento no número geral de executivas, redução nas diferenças salariais médias ou melhora no ambiente corporativo.

"O estudo nos diz que cotas para os conselhos podem não ser o instrumento político ideal para promover mudanças rápidas na situação das mulheres nos negócios", afirma Bertrand.

Ainda assim, a pesquisa refuta uma das principais críticas ao uso de medidas de ação afirmativa para os cargos de comando empresarial -a de que as profissionais escolhidas não teriam qualificações para os cargos e seriam vistas como membros simbólicos da direção.

Brian Snyder/Reuters
Sheryl Sandberg, diretora do Facebook e autora de livro sobre as mulheres nos negócios
Sheryl Sandberg, diretora do Facebook e autora de livro sobre as mulheres nos negócios

RESISTÊNCIA

As empresas norueguesas resistiram a tal ponto à ideia de apontar mulheres para os conselhos que 384 das 563 empresas de capital aberto sujeitas às cotas optaram por fechar seu capital para não precisar cumprir a norma.

Mas o aumento da representação feminina nos conselhos noruegueses, de 5% dos cargos em 2000 a 40% em 2007, mostrou que a qualificação das mulheres indicadas para essa função também avançou.

"Redes antes inexploradas de mulheres executivas foram ativadas com a adoção da norma", aponta a pesquisa. Isso inclui o uso de um banco de dados criado pelo governo para listar os nomes de candidatas qualificadas.

Elas também passaram a receber remuneração mais equitativa e o número de mulheres entre os executivos de cargos mais altos nas empresas igualmente cresceu.

Eric Piermont/AFP
Marissa Mayer, 39, presidente do Yahoo!, é uma das mais jovens do ranking
Marissa Mayer, 39, presidente do Yahoo!, é uma das mais jovens do ranking

QUESTÃO DE ESPERA

As autoras esperavam constatar que essas mulheres, por sua vez, usariam suas redes de contatos para indicar colegas, impor normas como a oferta de creches no local de trabalho ou inspirar as mais jovens a demorar mais a ter filhos e, assim, continuar na disputa pelo comando das companhias.

Mas nos dez anos transcorridos desde que a Noruega aprovou a lei, nada disso aconteceu.

"Uma explicação pode ser a de que coisas como essas requerem mais tempo", diz Linda Bell, professora de economia e diretora letiva do Barnard College.

Em um estudo publicado em 2005, ela escreveu que a ação afirmativa para os cargos mais altos ajudava a carreira das mulheres porque executivas e conselheiras tenderiam a contratar mais mulheres e a pagá-las melhor.

"Minha pesquisa realmente demonstra que essas redes funcionam, que as mulheres ajudam outras mulheres. E o fazem de maneiras silenciosas e sutis", ela afirma.

Por quanto mais tempo as mulheres vão? Nos Estados Unidos, elas ficam com 16,9% dos assentos nos conselhos das 500 maiores empresas, de acordo com a Catalyst, uma organização que estuda a situação das mulheres nos negócios. A proporção não está crescendo.

"Continua a existir em muitas companhias uma mentalidade de que 'já temos uma mulher no conselho, então está tudo certo', mas não há um esforço para reservar um terço ou metade dos postos de conselho para as mulheres", diz Ilene Lang, consultora sênior da Catalyst.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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