Folha de S. Paulo


"Investidores não fogem das ações se as estatais são boas", diz autor

Privatizar ou estatizar? O tema é sensível às vésperas de uma campanha presidencial –ainda mais em meio à criação de uma CPI da Petrobras.

Os professores Sérgio Lazzarini, do Insper, e Aldo Musacchio, de Harvard, mostram no livro "Reinventing State Capitalism" (Reinventando o Capitalismo de Estado) que a discussão é mais profunda do que demonstra o oportunismo com que a tratam alguns políticos.

A obra indica que o "capitalismo de Estado" se reinventou nos últimos anos. Os países abriram o capital de suas estatais para melhorar a gestão ou privatizaram e mantiveram participações minoritárias nelas.

Zé Carlos Barreta/Folhapress
O professor do Insper Sergio Lazzarini, um dos autores do livro
Sergio Lazzarini, um dos autores do livro "Reinventing State Capitalism"

"Os investidores não fogem das estatais. Eles só querem boas estatais", disse Lazzarini à Folha, sobre a queda das ações da Petrobras. Lançado nos EUA, o livro deve sair no Brasil em outubro pela Companhia das Letras.

Folha - O que é o "capitalismo de Estado"?

Sergio Lazzarini - Quando se fala em "capitalismo de Estado", o que vem na cabeça é uma estatal tradicional como os Correios. Mas hoje os governos participam das empresas por meio de participações acionárias, que podem ser majoritárias, como na Petrobras, ou minoritárias, como as fatias do BNDES em diversas companhias.

Como o "capitalismo de Estado" se reinventou?

O Estado se expandiu muito após a crise de 1929. Na América Latina e na Ásia, o setor público cresceu quando os países tiveram que se industrializar.

Por necessidade ou ideologia, os governos abraçaram a economia e foram tentados a fazer políticas que suportavam seus interesses. Nos anos 1980, esse modelo de estatal faliu e vieram as privatizações.

O que ocorreu?

Ao contrário do que se pensa, o Estado permaneceu nas empresas com participações minoritárias. A Vale é um caso típico no qual o bloco de controle é formado por empresas privadas, BNDES e fundos de pensão. Em tese isso pode ser positivo, pois é gestão privada com participação do governo para suprimir falhas de mercado, como captar recursos para um grande projeto.

Em vários países, também ocorreu a transformação das grandes estatais em corporações. São estatais listadas em Bolsa, transparen- tes, que atraem investidores externos. A Petrobras teoricamente passou por isso.

Esses modelos foram deturpados?

Se as instituições não são sólidas, a estatal é capturada de novo pelo governo. Não adianta a empresa ser listada em Bolsa se a presidente dá uma canetada para segurar o preço da gasolina.

Também não adianta um banco de desenvolvimento apoiar empresas se não houver critério de alocação de recursos e forem escolhidas campeãs nacionais.

Comparamos a norueguesa Statoil com a Petrobras. Lá o presidente não é sujeito a interferência política, há muitos conselheiros externos e o órgão regulador é forte.

Uma empresa estatal deve ter objetivos sociais?

Se a empresa não tem objetivo social, por que ser estatal? É natural que ela queira desenvolver setores que o setor privado não atende. Tudo bem se isso for claro e estável. Se os investidores soubessem qual é a política de reajuste de preços da Petrobras, não haveria problema.

A Petrobras é o grande exemplo de "capitalismo de Estado" no Brasil e vive uma grave crise. Como resolver?

No final dos anos 1990, a Petrobras estava se modernizando e melhorando sua governança. Mas começou a ser utilizada para fins políticos e até geopolíticos, como a parceria com a PDVSA (estatal venezuelana). O golpe de misericórdia foi o controle do preço da gasolina.

É preciso reforçar o conselho com técnicos, fortalecer a agência reguladora e definir um modelo previsível de reajuste da gasolina.

Qual é o futuro do "capitalismo de Estado"?

A participação do Estado nas empresas veio para ficar e cada país terá o seu modelo, que vai depender do impacto na opinião pública. O fato é que não dá para usar as estatais para fins eleitorais e controle direto da economia. Um dia a conta chega.

"Reinventing State Capitalism - Leviathan in Business, Brazil and Beyond"
AUTORES Sergio Lazzarini e Aldo Musacchio
EDITORA Harvard University Press
QUANTO US$ 44 (R$ 98; 368 págs.)


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