Folha de S. Paulo


Economista critica crença em especialistas e sugere rebeldia

Em um mundo hiperveloz, em que cada pessoa precisa tomar até 10 mil decisões por dia, em que o consumo de informações já é pelo menos três vezes superior do que há 50 anos e em que usuários de computador trocam de janelas e conferem o e-mail 37 vezes por hora, o desafio é saber escolher no que acreditar diante de fontes tão díspares e nem sempre confiáveis.

Neta de rabino e filha de feminista que a criou alertando para que "nunca lavasse as meias de um homem", Noreena Hertz, 46, economista influente, frequentadora do circuito Davos-TED, amiga de figuras antenadas como Bono Vox e que escreve para publicações como "Financial Times" e "New York Times", lança neste mês no Brasil "De Olhos Bem Abertos".

O livro é fruto de uma situação de doença gastrointestinal em que Noreena, diante de diagnósticos descabidos feitos por diversos médicos, deu-se conta do quanto fazemos escolhas erradas por não assumirmos a responsabilidade por nossas decisões, seja pela manipulação do mercado, pela confiança cega em especialistas ou por fatores emocionais.

É um livro de autoajuda que se utiliza de uma estrutura de estratégias para reeducar o indivíduo nas suas tomadas de decisão. Incentiva a sair dos limites preestabelecidos e imaginar o inimaginável. Apresentando estudos, estatísticas, experimentos com humanos sob influências externas ou de humores, procura desvendar o funcionamento do cérebro abrindo a mente e os olhos a caminho das almejadas decisões inteligentes, sejam elas estratégicas ou triviais.

Um exemplo é a experiência mostrando que uma garçonete vestida de vermelho ganha mais gorjetas do que as parceiras vestidas com outras cores. O livro discorre sobre possíveis mecanismos de desmonte do sistema autômato e do mercado, como o culto ao mensurável, em que números são endeusados e tidos como verdades inquestionáveis quando são perfeitamente manipuláveis.

Arquivo Pessoal
A economista Noreena Hertz, autora do livro

Mas "De Olhos Bem Abertos" cai na armadilha típica dos livros de autoajuda, de primeiro capturar o interesse do leitor com descobertas singulares para em seguida derramar uma série de lições previsíveis e repetitivas.

O jornal britânico "The Guardian" fez uma crítica humorada ao livro: "Noreena é uma especialista nos alertando sobre tomarmos cuidado com especialistas".

O capítulo final resume a sua proposta: "Fortaleça-se, assuma o controle, seja rebelde, incentive as divergências, conheça-se melhor, dê-se tempo e espaço para pensar, compreenda o mundo a sua volta, aceite a incerteza, permita-se mudar de rumo".

ANTIGLOBALIZAÇÃO

No início de sua carreira, Noreena teve contato com o capitalismo nascente na Rússia pós-soviética, contratada pelo Banco Mundial. Por cinco anos, viu de perto as consequências do colapso das instituições locais como hospitais e escolas, sob pressão das privatizações.

Lançou dois livros desde então. "The Silent Takeover" (A tomada silenciosa, de 2001) e "The Debt Threat" (A ameaça da dívida, de 2008), nunca editados no Brasil. Em ambos tratou do tema da ética no mercado, construindo em torno de si a imagem de "it girl" da antiglobalização.

Em entrevista à Folha, ela defende um capitalismo mais humano: "Acho que houve uma evolução por parte dos consumidores que se preocupam mais com a sustentabilidade. Mas vale se perguntar se a ética virou produto ou se a humanidade está realmente enraizando os pés no chão diante da iminência de alguma catástrofe".

Questões extremamente relevantes numa época em que os limites éticos estão em jogo diante das mudanças. É uma pena que pouco desse assunto esteja em "De Olhos Bem Abertos".

Colaborou TRACY SEGAL

DE OLHOS BEM ABERTOS - COMO TOMAR DECISÕES INTELIGENTES EM UM MUNDO CONFUSO
AUTORA Noreena Hertz
EDITORA Objetiva
QUANTO R$ 36,90 (304 págs.)
AVALIAÇÃO Regular


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