Folha de S. Paulo


Herdeiro do Casino quer liderar e-commerce

As palavras podem mentir, mas os números não.

É dessa forma que Gabriel Naouri, 32 anos, cita o que aprendeu (e aprende) com Jean-Charles Naouri, 64, presidente do Casino, desde que aceitou, em 2007, o convite do executivo (a quem chama pelo nome e não de pai) para entrar na companhia.

Com um mestrado em matemática aplicada na Universidade Paris-Dauphine, na França, foi no setor de fusão e aquisição do banco de investimentos Rothschild & Cie, em Nova York, que Gabriel iniciou a carreira há dez anos.

É o mesmo banco de que o pai se tornou sócio-gerente em 1987, após ter trabalhado em cargos de alto escalão no governo francês, incluindo o ministério de Finanças, nos anos 1980.

A aproximação de Gabriel com o varejo começou em 2006, quando virou diretor de marketing da marca de xampu Garnier, divisão da L'Oréal, e passou a ter contato direto com a equipe do Walmart, nos Estados Unidos.

"Aprendi a força da relação entre fabricante e varejo quando o Walmart era responsável por 50% das vendas do Garnier Frutics. Se dissessem quero que a tampa do produto seja redonda e não quadrada, mesmo que tivéssemos investido milhões e milhões em marketing, tínhamos de mudar tudo", diz.

Do coração financeiro de Nova York, Gabriel mudou para uma vila de 3.000 habitantes no interior da França, onde trabalhou por nove meses como padeiro, açougueiro, faxineiro, caixa e vigilante até aprender todas as funções de um hipermercado.

Foram mais cinco anos trabalhando em diferentes partes da França em lojas do hipermercado Géant , uma das bandeiras do grupo Casino, até assumir o cargo de responsável por operações e divisão de alimentos da rede.

Há pouco mais de um ano, assumiu a diretoria de marcas próprias, marketing digital e inovação do Casino.

François Daburon/Grupo Casino
Gabriel Naouri, filho de Jean-Charles Naouri (presidente do grupo Casino), na França
Gabriel Naouri, filho de Jean-Charles Naouri (presidente do grupo Casino), na França

MARCAS PRÓPRIAS

A primeira marca própria surgiu no Casino em 1901; hoje são 20 mil. "Está no DNA do grupo há mais de um século." Os produtos da rede devem chegar com mais frequência aos supermercados do Grupo Pão de Açúcar, controlado pelo Casino.

"Ainda há espaço para avançar no Brasil. Não será em um ano nem dois, mas vai crescer", afirma o executivo. No Brasil, a venda de itens dessa categoria representa 6% do faturamento. Na Europa, representa 20%.

A lógica para a expansão dos itens de marca própria, diz, é o preço: "Se for muito barato, ninguém compra. As pessoas pensam que não tem qualidade. É preciso saber precificar". Na França, se o cliente não aprova o produto de marca própria, o grupo devolve o dinheiro.

EXPERIÊNCIAS

Quando chegou ao cargo de diretor de inovação em 2012, Gabriel diz ter devolvido metade do orçamento que recebeu. "Se você dá muitos brinquedos para uma criança, ela perde o foco. Propus com a metade fazer mais, com foco no cliente, na loja, na mobilidade e em tecnologia."

O projeto é investir cada vez mais no marketing digital, com e-mails diários, respeitando o perfil de compras de cada cliente. "Na França, rádio e TV funcionam bem para promoções. As redes sociais, para a marca, e o e-mail é o canal com o cliente."

INTERCÂMBIO

Sobre a expansão no Brasil e em outros países em que o grupo atua -Colômbia, Argentina, Uruguai, Tailândia e Vietnã-, Gabriel diz que a ideia é "aumentar a troca de experiências".

A partir de 2014, por exemplo, um chef francês virá ao Brasil dar aulas no setor de padarias. Na contramão, produtos de várias marcas brasileiras serão vendidos em lojas do Casino na França.

"A primeira vez em que fui ao Brasil fiquei surpreso com a promoção do Extra de compre uma TV grande para a sala e ganha uma pequena para a cozinha. Fui à Cdiscount (loja on-line do Casino) e disse: vamos fazer o mesmo."

O modelo de vendas da Via Varejo (eletroeletrônicos) e da Nova Pontocom (empresa de comércio eletrônico formada pelos sites de Casas Bahia, Ponto Frio e Extra) deve ser alvo cada vez de mais intercâmbio com os franceses.

A retirada de produtos no sistema drive do grupo -o consumidor compra on-line e pode retirar em mais de cem lojas- é um dos sistemas "importado" da França que deve se expandir no Brasil, segundo afirma.

No Brasil, o serviço começou em caráter experimental (para alimentos e bebidas comprados do Extra-Delivery) em novembro, na loja do Morumbi, e deve ser levado para oito lojas da capita paulista até o 1º trimestre de 2014. Desde setembro, itens como smartphones, livros e tablets -comprados pelo e-commerce- podem ser retirados em outros dois pontos.

Nas vendas on-line no Brasil , a meta é ambiciosa. "Queremos ser o número 1 como na França", diz Gabriel, ao repetir o que outros executivos do grupo já têm dito, como uma espécie de mantra. A liderança do e-commerce brasileiro hoje é da B2W, que reúne Lojas Americanas e Submarino.

Gabriel é econômico nas palavras ao mencionar como foi o período de conflito entre o grupo e o empresário Abilio Diniz, que deixou recentemente a companhia fundada pelo pai em 1948.

"Foi uma época difícil. Mas negócios são negócios", diz. "Existe competição, divergências... Mas no Casino colocamos os sentimentos e o afeto de lado. Não é pessoal. É uma companhia em que não se trabalha somente para um acionista."

Herdeiro de Jean-Charles e provável sucessor do pai no cargo de presidente da companhia, Gabriel é discreto ao falar da relação com "Jean-Charles": "Pai, só temos um."

Sobre como é Jean-Charles no dia a dia na companhia, a resposta (vinda de um matemático) é racional: "É bem rigoroso. Mas há uma grande diferença de nível: ele é o CEO, e eu respondo apenas por uma parte. Aprendo muito observando como ele age. Para isso, não é preciso conversar durante horas. Basta olhar."

Os Diniz e os Naouris, apesar das disputas que os separaram no mundo dos negócios, guardam algumas semelhanças. Assim como um dos seis herdeiros de Abilio (o esportista e empresário João Paulo Diniz), Gabriel (um dos três herdeiros de Jean-Charles) é jovem, rico e bonito.

Mas, diferentemente de João Paulo, que já declarou uma vez que preferia trilhar seu caminho em diferentes negócios porque nunca iriam existir "dois Abilio Diniz", Gabriel, filho mais velho de Naouri, faz questão de dizer: "no grupo só tem dois Naouris".

A jornalista CLAUDIA ROLLI viajou a convite do Grupo Pão de Açúcar


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