Folha de S. Paulo


Crise em emergentes pesa e dólar renova maior preço em cinco meses

A crise na Argentina e na Turquia, mais uma vez, respingou nesta segunda-feira (27) no dólar no Brasil, que renovou suas máximas em cinco meses.

Após abrir perto da estabilidade, o dólar passou a subir diante do clima de aversão ao risco nos mercados internacionais, com os investidores fugindo de aplicações consideradas menos seguras, como em países emergentes.

Além disso, há uma expectativa pela próxima reunião do Fed (Banco Central americano), amanhã e na quarta, que decidirá se vai fazer ou não mais uma redução dos estímulos econômicos nos EUA. Se houver mais cortes, o volume de dinheiro disponível no país para investimentos em outros, como o Brasil, tende a diminuir. E, diante da perspectiva de menor entrada de dólares no mercado brasileiro, o preço da moeda americana sobe.

O dólar à vista, referência no mercado financeiro, subiu 0,76%, a R$ 2,420, maior patamar desde 22 de agosto do ano passado, quando a divisa encerrou cotada em R$ 2,4299.

O dólar comercial, usado no comércio exterior, registrou alta de 1,16%, a R$ 2,425, maior nível também desde 22 de agosto de 2013 (R$ 2,432).

Nesta segunda, o governo argentino anunciou que restringirá a compra de dólares como investimento aos cidadãos com renda mensal de no mínimo de 7.200 pesos (R$ 2.155) - o equivalente a dois salários mínimos -, registrados na Afip, a Receita Federal do país.

A Casa Rosada também informou hoje que o limite para a aquisição da moeda americana será de US$ 2.000 por mês.

"O medo é que os emergentes sejam contagiados pelo pessimismo em relação à Argentina. O investidor não quer saber se o Brasil é igual à Argentina. Ele quer tirar o dinheiro dele do jogo e ir embora", afirma André Moraes, analista da corretora Rico.com.vc.

Na Turquia, a preocupação é com o escândalo de corrupção que afeta o governo e com a expectativa de que o banco central turco anuncie um aumento dos juros para conter a saída de recursos do país.

O escândalo estaria relacionado a projetos estatais de construção e ao setor imobiliário, além de ao comércio de ouro da Turquia com o Irã.

O banco central turco convocou hoje uma reunião de emergência, para amanhã, após o avanço da desvalorização da moeda local, a lira, para nova mínima recorde. A expectativa é que a autoridade monetária suba o juro básico do país em 2,25 pontos percentuais, para 10% ao ano, para tentar conter a saída de investidores estrangeiros. Juros maiores deixam os títulos do país, remunerados pela taxa, mais atraentes.

Há ainda a expectativa de que o banco central americano dê continuidade à sua política de redução dos estímulos que concede à economia dos Estados Unidos. O mercado espera um novo corte de US$ 10 bilhões em seu programa de recompra de títulos, de US$ 75 bilhões para US$ 65 bilhões mensais.

O corte dos estímulos enxugaria o volume de recursos disponíveis para investimento nos emergentes, como o Brasil, prejudicando tanto a Bolsa quanto o câmbio nacional.

Para Guilherme Prado, especialista em câmbio da Fitta DTVM, a tendência do dólar segue ascendente, com a expectativa em torno da decisão do Fed pautando os investidores. "É uma questão de fundamentos. O mercado está olhando a decisão do Fed, e já trabalhando com um corte de US$ 10 bilhões", diz.

O Banco Central brasileiro deu continuidade às intervenções diárias no câmbio e vendeu oferta total de 4.000 contratos de swap tradicionais -equivalentes à venda futura de dólares. Foram 2.200 contratos com vencimento em 1º de setembro e 1.800 com vencimento em 1º de dezembro deste ano. A operação teve volume equivalente a US$ 197,2 milhões.

A autoridade monetária também realizou a oitava etapa da rolagem dos contratos de swap que vencem em 3 de fevereiro, vendendo a oferta total de 25.000 contratos. Com isso, restam apenas cerca de 10% do lote total do mês que vem, equivalente a US$ 11,028 bilhões.

BOLSA

A Bolsa brasileira também se contaminou com esse pessimismo dos investidores com os mercados emergentes e encerrou em baixa.

O Ibovespa, principal índice do mercado acionário brasileiro, caiu 0,18%, aos 47.701 pontos. A desvalorização do índice no mês já chega a 7,39%, quase a metade da registrada no ano de 2013 (15,5%).

A crise cambial e política na Argentina e na Turquia pesaram não só sobre a Bolsa brasileira, mas também sobre os mercados mundiais, afirma Luciano Rostagno, estrategista-chefe do banco Mizuho.

"Os últimos acontecimentos na Turquia e na Argentina têm impacto nos mercados locais. Primeiro no câmbio, pois a desvalorização do peso argentino trouxe a preocupação de uma crise cambial lá que poderia ter reflexos no Brasil, já que a Argentina é o terceiro maior parceiro comercial brasileiro", afirma.

Bruno Gonçalves, analista do WinTrade, home broker da Alpes Corretora, vê a Argentina com um impacto limitado sobre o mercado brasileiro. "A crise lá traz um sentimento adicional de preocupação com os mercado emergentes, mas não é um fator preponderante, pois a situação dos países é bem diferente", afirma.

Já Tatiane Cruz, analista da corretora Coinvalores, acredita que o mercado sabe distinguir os países. "Os investidores sabem separar o joio do trigo. O Brasil tem um sistema bancário muito sólido, empresas sólidas, e está barato", diz.

No cenário doméstico, o último boletim Focus do Banco Central não trouxe notícias muito animadoras para o mercado. Os economistas reduziram a projeção para a expansão do PIB (Produto Interno Bruto), para 1,91%, e elevaram a da taxa básica de juros (Selic) para 11% ao ano.

Ao longo da semana os investidores prestarão atenção à reunião do Federal Reserve (Fed, banco central americano), nos dias 28 e 29, e também à temporada de divulgação de balanços de empresas.

Na Bolsa o destaque ficou com os papéis da B2W, controladora da Americanas.com e do Submarino. As ações da empresa subiram 41,61%, a R$ 21,95, em resposta ao anúncio feito na sexta-feira (24) de aumento de capital.

A empresa pretende fazer capitalização de R$ 2,38 bilhões. O acordo prevê a emissão de 95,2 milhões de ações ao preço unitário de R$ 25.


Endereço da página: