Folha de S. Paulo


Chineses investem na Ucrânia para garantir cereais e carne

Enquanto começa a debater o direito de agricultores chineses venderem suas terras e se mudarem para as cidades, a China volta seus olhos para algumas das terras agrícolas mais produtivas do planeta, as da Ucrânia.

"Todo mundo na China já deve ter ouvido falar de mim, a essa altura", diz Oleg Bakhmatyuk, bilionário ucraniano fundador da UkrLandFarming, oitava maior companhia agrícola do planeta.
É dele também a Avangardco, segunda maior produtora mundial de ovos.

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Com vastas extensões de terra agrícola de alta produtividade, mas infraestrutura antiquada, a Ucrânia vem atraindo interesses de companhias chinesas que querem atender à crescente demanda de seu país por cereais e carne bovina.

O objetivo chinês é investir no exterior em técnicas agrícolas de alto rendimento.

David Gray - 16.out.2012/Reuters
Chinesa retira palha de milho em rodovia nos arredores de Pequim
Chinesa retira palha de milho em rodovia nos arredores de Pequim

Pequim teme que depender de alimentos adquiridos no mercado mundial possa causar alta nos preços mundiais da comida e criar fricção diplomática, diz Li Guoqiang, diretor assistente do Instituto de Desenvolvimento Rural na Academia Chinesa de Ciências Sociais.

Ampliar a oferta mundial de cereais é a única maneira de atender às necessidades chinesas, diz ele.

Até agora, a despeito de informações de que a China estaria adquirindo grandes propriedades agrícolas em outros países, poucos desses planos deram resultado. O maior obstáculo? Direitos de propriedade são um conceito desconhecido na China; as terras pertencem ao Estado.

"Querem que nós forneçamos tudo, que tudo esteja pronto para eles. Não compreendem que, aqui, são proprietários privados", disse um diplomata informado sobre os detalhes de um acordo fracassado com a China.

E é aí que entra a Ucrânia, onde empresas privadas adquiriram grande volume de terras agrícolas depois do colapso da União Soviética.

A UkrLandFarming cultiva cerca de 560 mil hectares. Embora a lei ucraniana proíba que estrangeiros sejam donos de terras, as grandes companhias agrícolas têm ações cotadas em Bolsas internacionais, o que permite que investidores negociem participações de capital.

TECNOLOGIA E LOGÍSTICA

Bakhmatyuk diz estar negociando com potenciais investidores da China acordos "bilionários" até o final deste ano. Dentre os negócios chineses futuros estão o financiamento de tecnologia e de logística para escoar os alimentos, como a construção de portos.

Os chineses estão "financiando projetos para garantir oferta estável de safras", diz Sergiy Kasyanov, acionista majoritário da KSG Agro, da Ucrânia. O grupo assinou uma carta de intenções com a Xinjiang Production and Construction, uma estatal chinesa que controla vastas terras nas regiões fronteiriças do país, no centro da Ásia.

A mídia da China informou que a companhia forneceria financiamento e infraestrutura de irrigação à Ucrânia, que está a ponto de colher uma safra recorde de 60 milhões de toneladas de grão, este ano.

Em outubro, o país fez o primeiro embarque de milho de sua história à China.

Investimentos bilionários e técnicas modernas poderiam dobrar a produção agrícola ucraniana, diz Bakhmatyuk, e fariam do país, hoje já um dos maiores exportadores mundiais de milho, cevada, olho de semente de girassol e trigo, um dos fornecedores dominantes de produtos agrícolas no mundo.

Os burocratas chineses percebem o potencial.

Kiev anunciou neste mês que está finalizando um acordo com o Export-Import Bank da China para um novo empréstimo de US$ 3 bilhões -metade em dinheiro, metade em maquinaria-, a fim de reconstruir sistemas de irrigação e apoiar outros esforços de modernização.

"Em lugar de petróleo e gás natural, estamos colhendo safras", diz Bakhmatyuk. "Agora estamos criando canais de escoamento, como se fossem os antigos gasodutos, para bombear nossas commodities para o mercado da China e outros."

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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