Folha de S. Paulo


Sertãozinho: a decadência da cidade que já foi o "Vale do Silício do biocombustível"

Para as famílias do município de Sertãozinho (SP), os imensos portões neoclássicos que decoram a entrada da cidade são um lembrete dolorido de um passado glorioso.

Em 2008, a cidade de 100 mil habitantes se tornou o centro da florescente indústria brasileira do etanol --o chamado "Vale do Silício do biocombustível". Aninhada em meio às mais férteis plantações de cana do Brasil, cerca de quatro horas de carro ao norte de São Paulo, Sertãozinho atraia investimentos bilionários em usinas de álcool e desfrutava de um ritmo de crescimento comparável ao da China.

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Para celebrar o prestígio que conquistava, a cidade gastou R$ 300 mil nos novos portões de entrada e mais R$ 2,5 milhões em uma estátua do Cristo Redentor de 57 metros de altura, que apequena o original no Rio de Janeiro.

Mas Sertãozinho não sabia que seu destino já havia sido decidido a mais de mil quilômetros de distância, quando a Petrobras descobriu imensas reservas petroleiras offshore (operação marítima de petróle).

DECADÊNCIA

Sertãozinho agora está quase deserta. Os subsídios brasileiros à gasolina tornam difícil aos produtores de etanol concorrer nos postos de gasolina. A maioria dos automóveis brasileiros tem motores flex, que permitem aos motoristas optar entre gasolina e álcool como combustível.

As usinas de açúcar e álcool brasileiras foram pesadamente atingidas pela crise financeira mundial, mas os limites do governo para os aumentos da gasolina aceleraram a destruição do setor.

O mais importante é que a incerteza quanto aos futuros preços da gasolina prejudica o investimento no setor, diz Adhemar Altieri, diretor da Unica, a organização setorial dos produtores brasileiros de açúcar e álcool. "Quando o preço do nosso concorrente pode ser reajustado por capricho, a imprevisibilidade é excessiva. Torna-se difícil pedir que alguém invista apaixonadamente no setor", diz.

Embora 30 usinas tenham sido construídas em 2008 na região centro-sul, não existem planos para novas instalações, agora.

Altieri acrescenta que "não estamos procurando por garantias, mas precisamos saber o que o governo quer. Qual o lugar do etanol em seus planos?"

DESEMPREGO

Depois que muitas das usinas de álcool de Sertãozinho fecharam as portas, o índice local de desemprego disparou.

"Lembro-me do dia em que perdi o emprego, porque foi exatamente seis meses depois que meu segundo filho nasceu", diz José Totoli, que era operário metalúrgico em uma usina de etanol, na saída do superlotado centro de empregos da cidade, onde ele conta ter acabado de passar por uma entrevista para um emprego de tempo parcial como segurança.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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