Folha de S. Paulo


Esquemas suspeitos de pirâmide geram incerteza entre investidores

Moradores de cidades ricas do interior de Mato Grosso apostaram alto e agora vivem momento de incerteza em relação a bloqueios determinados pela Justiça nas contas de empresas investigadas por suspeita de formação de pirâmide financeira.

A atividade da TelexFree, que vende pacotes de telefonia via internet, foi "congelada" por ordem da Justiça do Acre. A empresa BBom, de aparelhos para rastreamento de veículos, também teve suas contas bloqueadas pela Justiça de Goiás.

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As empresas dizem fazer "marketing multinível". Oferecem ganhos progressivos a partir da compra de cotas e, sobretudo, da formação de redes de divulgadores dos negócios. Como atrativo, falam de fortunas que teriam sido obtidas da noite para o dia.

Em cidades mato-grossenses que enriqueceram com a exportação de soja, sobram histórias de pessoas que comprometeram economias, venderam bens e contraíram dívidas para comprar cotas.

Funcionários públicos fizeram empréstimos consignados. Empresários usaram capital de giro de seus negócios para aplicar no sistema. A maioria, quando questionada, prefere não comentar o assunto. E quem fala defende o modelo de negócio.

"O bloqueio veio na hora em que ia usufruir os lucros. Passo vergonha na rua com meus credores", disse Rosa Cruz, 53, de Sinop.

Servidora pública federal recém-formada em direito, ela aplicou R$ 30 mil em cotas da TelexFree --dinheiro que havia reunido para abrir um escritório de advocacia. E tem outros R$ 30 mil bloqueados na BBom. Em Lucas do Rio Verde, o comércio local já sente os efeitos das decisões.

"Quem ganhava com essas empresas era pouco cauteloso ao gastar. Isso acabou", diz Edenio Bassani, presidente da associação comercial.

Até o prefeito chegou a ter o nome usado para atrair divulgadores e teve de publicar um desmentido nas redes sociais. "Nunca fiz negócio [com as empresas do ramo] e nem tenho interesse", reagiu Otaviano Pivetta (PDT).

O técnico em sistemas Marlon Silveira, 24, tomou empréstimo no banco e investiu R$ 11 mil na Telexfree. Diz ter recuperado o valor investido e que vinha tendo lucro. "Ninguém aqui está quebrado por causa da TelexFree. O problema é o bloqueio."

Em Rondonópolis, o advogado Samir Dib, 40, investiu R$ 101 mil horas antes do bloqueio nas contas da TelexFree. Na semana passada, conseguiu na Justiça o direito de receber o dinheiro de volta. "Fui enganado", diz.

Para o advogado, quem aplicou na empresa deve procurar a Justiça. "O Judiciário vai ficar abarrotado, mas, se for esperar a ação do Ministério Público, duvido que todos recebam o que pagaram."

OUTRO LADO

A Telexfree e a BBom negam que atuem no modelo de pirâmide financeira.

Em notas publicadas na internet, a Telexfree afirma estar sendo vítima de uma decisão "injusta e ilegal", que "espalhou caos e desespero". Afirma ser "viável" e cita o "brilhante futuro" de seu modelo de negócios.

A reportagem não conseguiu contato com representantes da TelexFree. A página da empresa não traz números de telefone e não houve resposta de escritórios de advocacia associados à defesa da empresa na Justiça.

Em e-mail à reportagem, a BBom se define como "empresa especializada em canal de vendas direta e marketing multinível". Disse ainda que pretende "retirar todo impedimento às suas atividades".

"A empresa reitera que está à disposição das autoridades para prestar todos os esclarecimentos que possam contribuir para o real entendimento de sua atividade."

Sobre os questionamentos do MPF sobre os aparelhos de rastreamentos, que não são homologados pelo Denatran, a BBom disse que "nenhuma empresa de rastreamento é obrigada a operar sob homologação do Denatran".


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