Folha de S. Paulo


Captação de empresas brasileiras deve ficar em espera até setembro

O mercado de capitais deve ficar congelado para empresas brasileiras pelo menos até setembro, em meio às incertezas sobre o futuro da política monetária norte-americana que anteciparam o tradicional recesso de verão no Hemisfério Norte.

Prejudicadas também pelo cenário macroeconômico adverso do país --inflação alta, fraco crescimento do PIB e dólar valorizado--, nomes como Votorantim Cimentos, Azul, BNDESPar e Odebrecht estão engavetando seus programas de captação em títulos e ações.

Outras companhias tendem a seguir o mesmo caminho, disseram analistas e observadores do mercado, apesar da CPFL Renováveis ter divulgado nesta quinta-feira (27) os termos de um IPO (sigla em inglês para oferta pública inicial de ações) lançamento que pode movimentar cerca de R$ 1,5 bilhão em julho.

De acordo com o executivo-sênior de global banking do HSBC, Paulo Cesar Souza, os investidores não querem correr risco de pagar caro por papéis de mercados emergentes enquanto os títulos do governo dos EUA, de menor risco, podem ficar mais atrativos. "A liquidez está empoçada", disse.

Além disso, as empresas não têm tanta urgência para captar agora quanto tinham durante a crise financeira de 2008, que pegou muitas companhias altamente endividadas.

A expectativa de alta dos juros nos EUA dificultou a precificação das ofertas oriundas de países emergentes, incluindo as brasileiras, levando a uma reavaliação dos preços das operações neste cenário, disse Souza.

A turbulência política causada pelas manifestações em todo o Brasil ajudou a deixar o investidor ainda mais cauteloso, assim como a decisão da Standard & Poor's, no início do mês, de colocar o rating da dívida brasileira em perspectiva negativa.

O principal índice da Bovespa, medida do cenário mais adverso, acumulava até a véspera queda de quase 12% em junho.

Com isso, as conhecidas férias no Hemisfério Norte, em agosto, foram antecipadas para emissões do Brasil.

"O investidor vai ficar quieto até setembro porque nada acontece em agosto, e julho costuma ser fraco", disse o diretor do HSBC.

O diretor da Anbima, Márcio Guedes, também acredita que a pasmaceira deve continuar até de setembro.

"As empresas precisam de um investidor mais sereno para avaliar as ofertas", afirmou.

CAPTAÇÕES SUSPENSAS

As captações que estavam programadas foram suspensas porque as empresas não aceitaram os preços que os investidores estão dispostos a pagar, segundo o diretor da área de mercado de capitais do Espírito Santo Investment Bank, Miguel Guiomar.

No caso das ofertas de ações, o caso mais emblemático foi o anúncio de que a Votorantim Cimentos decidiu suspender seu IPO estimado em R$ 10,3 bilhões porque não queria vender ações abaixo do piso da faixa sugerida de R$ 16 a R$ 19.

A companhia Azul Linhas Aéreas Brasileiras deve anunciar decisão semelhante nos próximos dias, de acordo com informação publicada pela Reuters.

Ofertas de títulos de renda fixa também foram paralisadas, como a emissão de R$ 2,5 bilhões em debêntures do BNDESPar, braço de participações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e a emissão de bônus da Odebrecht, avaliada em até US$ 1,88 bilhão.

RETOMADA COM NOVOS PREÇOS

Mesmo quanto voltar, o mercado internacional não será como antes, segundo os especialistas, que preveem preços já não tão bons para os emissores como os vistos nos primeiros meses do ano.

"O mercado estava atrativo. Foi bom enquanto durou", disse o diretor do HSBC.

Segundo ele, o mercado poderá retomar nos últimos meses do ano, mas os preços obtidos pelas empresas brasileiras devem ser outros.

A superintendente executiva de mercado de capitais do Santander, Cristina Schulman, também avalia que as taxas mudarão de patamar.

"A gente estava com níveis que eram historicamente vantajosos para as empresas, mas na próxima janela as empresas vão pagar um preço diferente", afirma.

Isso ocorrerá porque o investidor está vendo o aumento das taxas pedidas nos EUA, e vai exigir melhor remuneração das empresas que estão mais longe e têm risco maior.

Mesmo assim, os executivos acreditam que as empresas não vão buscar, por enquanto, outros caminhos para se capitalizar.

No ano até maio, as empresas brasileiras captaram US$ 25 bilhões em títulos no exterior, impulsionadas pela emissão de US$ 11 bilhões feita pela Petrobras.

O montante indicava movimento neste ano bem superior à média dos três anos anteriores, quando as captações externas anuais ficaram entre US$ 37 bilhões e US$ 50 bilhões, segundo a Anbima.

CAPTAÇÃO DOMÉSTICA

Já as captações domésticas de renda fixa e variável em 2013 até maio somaram R$ 52 bilhões, volume próximo ao do mesmo período do ano anterior (R$ 50 bilhões), antes que ofertas de debêntures começassem a ser suspensas em junho.

Na renda variável, a BB Seguridade fez em abril o maior IPO brasileiro desde a oferta do Santander, com a captação de R$ 11,4 bilhões.

A boa notícia é que, diferente da crise de 2008, desta vez a maioria das grandes empresas está bem capitalizada.

"As empresas maiores alongaram seus passivos e fizeram um pré-funding. Elas podem esperar", disse o diretor do Espírito Santo Investment Bank.

De acordo com Cristina, do Santander, empresas brasileiras e estrangeiras estavam indo a mercado para adiantar demandas de recursos para meados ou para o fim de 2014, e por isso não estão com pressa, ao menos por enquanto.


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