Folha de S. Paulo


Índia ainda está despreparada para mundo que não é mais plano

A Índia foi uma das maiores beneficiárias da globalização profunda que o mundo viveu do fim da Guerra Fria à Grande Recessão de 2008.

Salários baixos, domínio do inglês, tradição têxtil e serviços em que infraestrutura logística não pesa a tornaram a pátria do "outsourcing".

'Papa' da terceirização começou a operar sem telefones

Some-se a perspectiva de bônus demográfico à indústria de tecnologia da informação, liderada por cérebros treinados em mecas tecnológicas como o MIT (EUA), e se explica a média anual de 7% de avanço do PIB em 15 anos.

O que o "mundo plano" possibilitou à China na produção de manufaturas, ele deu à Índia no setor de serviços e TI "" um caudaloso fluxo de investimentos e ideias em busca de produção eficaz.

Os indianos aprofundam-se onde têm vantagens competitivas e investem para que seus talentos se formem nas melhores escolas do mundo em engenharias e ciências.

Como poupam quase 35% de seu PIB, poderiam destinar mais do que 1% da produção anual à inovação. Mas seu governo é paquidérmico.

A maior democracia do mundo tem estruturas partidárias confusas; uma classe política pouco funcional; sua burocracia estatal é considerada a pior da Ásia; e o sistema de castas é imobilizador.

Daí vêm as contradições: mais celulares que vasos sanitários; mais bilionários que o Reino Unido e mais pobres que toda a África.

O eixo "outsourcing-TI" foi um bom modelo de adaptação criativa a um mundo plano. Mas o mundo já é outro.

A desglobalização detonada pela crise de 2008 convida ao refluxo de postos e ativos industriais para os EUA.

Na reglobalização à frente, ditada por mega-acordos e pela busca da China por valor agregado, as cadeias de produção global ganham força. A Índia, como o Brasil, não tem estratégia para um mundo que não é plano.

MARCOS TROYJO, economista e cientista social, é professor-adjunto da Universidade Columbia, onde dirige o BRICLab, e leciona no Ibmec


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