Folha de S. Paulo


Com mais aparelhos de uso comum, mundos real e virtual estão perto de se juntarem

A comercialização, nos anos 90, da "rede de redes" --como ela um dia foi conhecida-- transformou todos os aspectos dos negócios, governo e sociedade.

Agora, a Internet está à beira de uma nova onda de inovação. Bilhões de aparelhos de uso comum, máquinas industriais e até mesmo comunidades inteiras estão a ponto de se conectar de uma maneira jamais vista, usando sensores, elos de telecomunicação e a infraestrutura da Internet.

"Mais objetos portam sensores e estão ganhando a capacidade de se comunicar", escreveram Michael Chui, Markus Löffler e Roger Roberts na "McKinsey Quarterly", em 2010.

"As redes de informações resultantes prometem criar novos modelos de negócios, melhorar os processos das empresas, e reduzir custos e riscos".

Em 2008, o número de coisas conectadas à Internet ultrapassou o número de seres humanos no planeta pela primeira vez. A Cisco, fabricante de equipamento para redes, previu que, até 2020, haveria mais de 50 bilhões de aparelhos conectados.

A próxima geração da Internet é conhecida por diversos nomes - "Internet das coisas", "Internet de tudo", "comunicação máquina-máquina" (M2M) ou "internet industrial".

Qualquer que seja a nomenclatura adotada, ela promete oferecer novas maneiras de administrar processos de negócios, ajudar os governos a operar com mais eficiência e transformar serviços com o setor de saúde.

"O mundo está no limiar de uma nova era de inovação e mudança", disse Bill Ruh, vice-presidente do centro de software e análise de dados da GE.

SENSORES DE BAIXO CUSTO

Chris Curran, sócio e vice-presidente de tecnologia da divisão de consultoria da PwC, concorda. A ascensão dos sensores de baixo custo e de aparelhos capazes de conexão às redes de telecomunicações está mudando a maneira pela qual empresas ajudam os clientes a atingir metas pessoais e criar valor para seus negócios, ele diz.

Há informações que estão sendo extraídas da maneira pela qual as pessoas usam produtos e serviços, e até mesmo dos ambientes pelos quais elas se deslocam.

Ruh define o processo como "a próxima revolução", e acredita que ela terá "a mesma magnitude que o desenvolvimento e adoção em massa da Internet aberta ao consumidor".

Ele acrescenta que "os próximos 10 anos verão um movimento propelido por software que será nada menos que espetacular: sistemas analíticos que aprenderão com a experiência e melhorarão constantemente, inteligência mecânica que combinará produção digital e percepção humana a fim de transmitir conhecimento e intuição [que poderá ser personalizada] para qualquer necessidade".

A Internet das coisas, diz ele, usará os serviços "big data" --termo que descreve o volume de informação gerado pelas operações tradicionais de negócios e fontes eletrônicas como as mídias sociais-- a fim de conectar máquinas ao mundo do trabalho.

"Isso vai significar máquinas altamente inteligentes-- de turbinas a jato a turbinas gás e tecnologia de saúde--, que se conectarão, comunicarão e cooperarão".

Crucial para o sucesso de uma estratégia como essa será o desenvolvimento de software e máquinas que possam ponderar as escolhas entre diversas decisões, e suas consequências, aplicar lições aprendidas e oferecer as informações corretas a outras máquinas, companhias e pessoas, que permitam que elas tomem decisões, colaborem e ajam.

"A promessa [da Internet das coisas] capturou a imaginação dos consumidores e das empresas igualmente", diz Chad Jones, vice-presidente de gestão de produtos da Xively, uma subsidiária da LogMeIn, produtora de software para computação em nuvem.

Ele alerta que a infraestrutura necessária para transformar essas ideias em realidade será "complexa e requererá conhecimentos especializados significativos, que irão além dos aparelhos e dos aplicativos, e estarão além da capacitação e dos recursos de muitas empresas".

SERVIÇOS NA NUVEM

Companhias como a GE e a Xively planejam oferecer serviços em nuvem que permitirão que empresas colaborem abertamente e criem produtos que outros poderão compartilhar a fim de superar algumas dessas dificuldades --ou é isso que as companhias esperam.

Algumas empresas já estão começando a explorar o volume de dados que um planeta repleto de sensores, medidores inteligentes e modems provavelmente gerará.

"Hoje, mais de 90% das informações que existem no mundo industrial passam sem observação ou não são nem mesmo armazenadas", diz Ruh.

No entanto, ao usar essas informações a fim de compreender melhor como podem ser usados os recursos, por exemplo o combustível, ou como operações de negócios podem ser conduzidas de modo mais eficiente, a GE acredita que será capaz de identificar cerca de US$ 1 trilhão em possível economia de custos a cada ano.

A mudança de uma economia analógica para uma economia digital está propelindo uma mudança na arquitetura de como serviços e produtos terão de ser criados e fornecidos, diz Ruh.

"Não fizemos muito até agora para ajudar a Internet a transformar as operações industriais."

Mas as recompensas podem ser enormes.

A GE prevê que a Internet das coisas "abrirá as portas a diversos benefícios para a economia industrial, permitindo que reduzamos o desperdício em US$ 150 bilhões em grandes setores como a energia, saúde, aviação, ferrovias, petróleo e gás natural, e mais, resultando em níveis novos de produtividade e em grande economia de custos".

Por exemplo, diz Ruh, "o potencial de melhorar as operações e a gestão de ativos das companhias de aviação --usando dados de desempenho dos aviões, prognósticos, sistemas de análise preditivos e dados em tempo real de sensores instalados em todas as áreas de um aparelho-- significa que os ativos das companhias de aviação poderão ser otimizados de forma a prolongar a vida das turbinas".

"Isso poderia permitir reduzir o número de paradas para manutenção não programadas, e substitui-las por paradas programadas, identificando possíveis perturbações antes que ocorram", ele acrescenta.

O escopo para aplicações nos sistemas mundiais de transporte também é imenso.

PILOTO AUTOMÁTICO

Uma ilustração disso é o Trip Optimizer, da GE, um software que serve como numa espécie de piloto automático para locomotivas, permitindo calcular a maneira mais eficiente de operá-las levando em conta fatores como comprimento do trem, peso, aclives e declives, condições dos trilhos, clima e desempenho individual da locomotiva.

O sistema controla automaticamente o acelerador do trem, ajudando a mantê-lo no horário e minimizando o uso de combustível.

Uma rede sofisticada de computadores de bordo e sistemas GPS atualiza as informações de percurso em tempo real. Se os trens de carga do planeta usassem 1% menos de combustível, seria possível economizar US$ 27 bilhões no custo do combustível, segundo a GE.

"Vivemos o momento no qual a tecnologia operacional está se combinando à tecnologia de informação", diz Ron Tolido, especialista em inovação de aplicativos na consultoria Capgemini. "Estamos começando a ver uma verdadeira fusão entre as coisas e a informação", diz.

O desafio, afirma, "será encontrar o balanço correto entre a forma pelas qual experimentamos o mundo dos objetos tangíveis e a maneira pela qual expandimos essa perspectiva via informação. Não desejamos que a informação se torne dominante, o que poderia confundir nossa visão de mundo; mas queremos que ela seja um acréscimo valioso ao que estamos experimentando e fazendo, e se manifeste apenas quando necessário".

Ele acrescenta que "a questão não é como criar ainda mais informação e tecnologia em torno de nós, mas como restringi-la ao que realmente importa".

"Analisar os dados que a Internet das coisas tornará disponíveis muitas vezes envolverá filtrar o que é irrelevante, e não descobrir o que é valioso", ele afirma.

"Máquinas inteligentes, de turbinas a jato a turbinas a gás, se conectarão, comunicarão e cooperarão".

Tradução de Paulo Migliacci


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