Folha de S. Paulo


Canteiro principal de obras da Belo Monte é ocupado por índios

O canteiro principal da hidrelétrica Belo Monte (PA) foi ocupado por indígenas nesta quinta-feira (2), paralisando os trabalhos no local, informou o CCBM (Consórcio Construtor Belo Monte), responsável pelas obras civis na usina.

Os índios pedem a suspensão das obras, estudos relacionados às barragens nos rios Xingu, Tapajós e Teles Pires, e que seja feita consulta prévia aos povos da região antes de decidir sobre a construção de hidrelétricas.

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As reivindicações foram publicadas em nota no site do Cimi (Conselho Indigenista Missionário).

"Vocês precisam regulamentar a lei que regula a consulta prévia aos povos indígenas. Enquanto isso, vocês precisam parar todas as obras e estudos e as operações policiais nos rios Xingu, Tapajós e Teles Pires", disseram os indígenas na carta sobre a ocupação (leia a íntegra abaixo).

Segundo o Cimi, cerca de 200 índios das etnias Munduruku, Juruna, Kayapó, Xipaya, Kuruaya, Asurini, Parakanã e Arara, além de pescadores e ribeirinhos estão ocupando o canteiro de obras e a "tropa de choque da Polícia Militar já esperava pelos indígenas" --mas não conseguiu barrar os manifestantes.

A ocupação se manterá por tempo indeterminado ou até que o governo federal atenda as reivindicações apresentadas, afirmou o conselho.

A Norte Energia, empresa responsável pela construção da usina, informou que cerca de 50 indígenas da etnia Munduruku ocuparam o escritório da empresa no canteiro Belo Monte. A assessoria da empresa ainda não tinha informações sobre as reivindicações.

A hidrelétrica no rio Xingu já passou por diversas paralisações desde o início da construção em 2011, causadas por greves de trabalhadores ou ocupações.

A última tinha ocorrido no fim de março, quando cerca de cem indígenas, ribeirinhos e pequenos agricultores afetados pela obra ocuparam o canteiro Pimental, um dos quatro da obra.

No começo de abril, 5.000 trabalhadores do mesmo canteiro paralisaram as atividades por conta das condições de trabalho e da demissão de 80 funcionários, no fim do ano passado.

A expectativa é de que a usina entre em operação em 2015 e tenha cerca de 11 mil megawatts (MW) quando estiver totalmente concluída.

A Norte Energia tem entre os acionistas a Eletrobras, os fundos de pensão estatais Petros e Funcef, a Neoenergia, a Cemig e a Light.

Atualmente, cerca de 22 mil trabalhadores atuam na construção da usina.

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Leia, abaixo, a íntegra da carta divulgada pelos indígenas:

"Carta da ocupação de Belo Monte

Nós somos a gente que vive nos rios em que vocês querem construir barragens. Nós somos Munduruku, Juruna, Kayapó, Xipaya, Kuruaya, Asurini, Parakanã, Arara, pescadores e ribeirinhos. Nós somos da Amazônia e queremos ela em pé. Nós somos brasileiros. O rio é nosso supermercado. Nossos antepassados são mais antigos que Jesus Cristo.

Vocês estão apontando armas na nossa cabeça. Vocês sitiam nossos territórios com soldados e caminhões de guerra. Vocês fazem o peixe desaparecer. Vocês roubam os ossos dos antigos que estão enterrados na nossa terra.

Vocês fazem isso porque tem medo de nos ouvir. De ouvir que não queremos barragem. De entender porque não queremos barragem.

Vocês inventam que nós somos violentos e que nós queremos guerra. Quem mata nossos parentes? Quantos brancos morreram e quantos indígenas morreram? Quem nos mata são vocês, rápido ou aos poucos. Nós estamos morrendo e cada barragem mata mais. E quando tentamos falar vocês trazem tanques, helicópteros, soldados, metralhadoras e armas de choque.

O que nós queremos é simples: vocês precisam regulamentar a lei que regula a consulta prévia aos povos indígenas. Enquanto isso vocês precisam parar todas as obras e estudos e as operações policiais nos rios Xingu, Tapajós e Teles Pires. E então vocês precisam nos consultar.

Nós queremos dialogar, mas vocês não estão deixando a gente falar. Por isso nós ocupamos o seu canteiro de obras. Vocês precisam parar tudo e simplesmente nos ouvir.

Vitória do Xingu (PA), 02 de abril de 2013."


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