Folha de S. Paulo


Diário de Madri: A seca que revela ruínas na Galícia

Uma seca histórica na região da Galícia, no noroeste da Espanha, fez baixar o nível da água de diversas represas. Ruínas se revelaram após décadas de esquecimento, atraindo visitantes a essa espécie de Atlântida ibérica, salpicada de aldeias e fortificações já apagadas dos guias de viagem.

A fortaleza de Castro Candaz, em Chantada, foi descoberta após os meses sem chuva. Suas pedras haviam sido escondidas pela represa de Belesar, assim como o povoado de Portomarín tinha sido afogado nos anos 1960, obrigando os moradores a se refugiar em regiões mais elevadas. São raras as ocasiões em que essas pedras ficam visíveis; nas casas e cemitérios abandonados que vieram à tona, elas mantêm intactas suas formas, segundo os relatos dos jornais locais.

Aos humores meteorológicos da Galícia se soma o fator político. Parte das represas que inundaram os povoados foi construída durante a ditadura de Francisco Franco (1939-75) e, por isso, o reaparecimento de construções traz de volta lembranças dos dissabores vividos naquele período.

A aldeia de Marquesado tornou-se temporariamente um epicentro do turismo regional. Visitantes caminharam por entre as casas até há pouco submersas. Jogados no chão, também surpreendidos pela seca, peixes mortos observavam a cena. Mas foi por pouco tempo. Já no fim de janeiro voltou a chover.

BATISMO DOMÉSTICO

Animais domésticos fizeram fila em janeiro diante da igreja de Santo Antão, em Madri, para receber seu batismo. O templo realiza anualmente esse ritual, fazendo jus ao patrono –Santo Antão do Deserto, um monge cristão egípcio que viveu entre os séculos 3 e 4. Ele é um padroeiro dos animais e costuma ser retratado com um porquinho aos pés. Um mercado nos arredores leva seu nome –não sem ironia, já que seu cardápio inclui variações de carne suína.

Jorge Guerrero/AFP Photo
Espanhóis levam seus animais para serem batizadas no dia de Santo Antão
Espanhóis levam seus animais para serem batizadas no dia de Santo Antão

A cerimônia de batismo coletivo, em 17 de janeiro, foi antecedida por cinco dias de festival animal. Houve, por exemplo, palestras sobre a criação de mascotes e feiras para a adoção de bichos.

A igreja, na rua Hortaleza, é conhecida pela figura já quase mítica do padre Ángel, responsável pelo acolhimento de moradores de rua e refugiados. É possível ver à noite, pelo vidro da porta, como os abrigados dormem nos bancos –usados, durante o dia, para as preces rotineiras.

TANGENTE

O município de Las Rozas, na região de Madri, é conhecido pelos gigantescos centros de compras. Galerias reúnem, lado a lado, outlets de marcas como Burberry e Ermenegildo Zegna. Boa parte do público e dos funcionários das grifes é de turistas ou expatriados chineses.

Las Rozas recebeu um convidado brasileiro nos últimos dias de janeiro. Ali, o Centro Cultural Pérez de la Riva expõe até 26/2 uma série de pinturas de Renato Costa, filho do artista Manuel Costa. Renato vive e trabalha na capital desde 2005.

A exposição, chamada "Tan-Gentes", recebeu um inesperado empurrão com a visita de Pedro Sánchez, ex-secretário-geral do PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol). Sánchez escreveu em sua conta oficial no Twitter estar "maravilhado" pela "força expressiva" do trabalho de Costa. O socialista afirmou também que dificilmente a obra deixaria os espectadores indiferentes.

RESSURREIÇÃO

Sánchez buscará o mesmo efeito, em breve, quando lutar contra a indiferença do eleitor socialista. Ele anunciou logo após sua visita à exposição que voltará a concorrer à liderança do PSOE. Um gesto de alguma coragem, já que renunciou a esse mesmo cargo em outubro, em meio a uma crise interna severa.

A liderança do PSOE ruiu após um longo impasse político, durante o qual a Espanha foi governada de maneira interina pelo conservador PP (Partido Popular). Sánchez e sua ala se recusavam a votar em favor do PP no Congresso e a permitir o novo mandato da sigla antagonista. A manutenção da postura levaria o país às terceiras eleições em um ano. Ele foi vencido pelos favoráveis a apoiar o governo, ainda que isso significasse frustrar os eleitores socialistas, avessos à legenda de centro-direita.

A vulnerabilidade dos partidos de esquerda é um fenômeno europeu e atinge também França, Itália, Reino Unido e Alemanha, que assistem ao crescimento de agremiações populistas de direita.

DIOGO BERCITO, 28, é correspondente da Folha em Madri


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