Folha de S. Paulo


Moura encantada

Ana Moura, a fadista que flerta com a música pop, lançou nesta sexta (27) um novo disco: "Moura". Gravado na América, foi produzido pelo canadense Larry Klein, vencedor de quatro Grammys, com quem ela já trabalhou no disco "Desfado", álbum mais vendido em Portugal dos últimos anos.

A mãe da cantora é angolana, por isso desde pequena que se ouvia em sua casa música deste país e fado. Isso reflete-se neste disco. Não só a herança africana está na sua voz, de timbre grave e sensual, como passa pelas colaborações.

Pedro Lopes - 18.jul.14/Brazil Photo Press/Folhapress
Cantora Ana Moura durante o Festival Meo Marés Vivas 2014, na Vila Nova de Gaia, no Porto
Cantora Ana Moura durante o Festival Meo Marés Vivas 2014, na Vila Nova de Gaia, no Porto

A canção que dá nome ao CD, "Moura", tem letra do escritor angolano José Eduardo Agualusa e música composta pelo angolano Toty Sa'Med. Outros dos temas, "Não Quero nem Saber", é da cabo-verdiana Sara Tavares e do angolano Kalaf (dos Buraka Som Sistema). Um dos nomes que Ana Moura canta pela primeira vez é Carlos Tê (famoso letrista do pai do rock português, Rui Veloso), que assina a música e letra da canção "O Meu Amor foi para o Brasil".

Conta a história de uma mulher abandonada por um homem que partiu para o Brasil e nunca mais deu notícias. Termina assim: O meu amor "está em São Paulo e trabalha em Telecom/ Já deve ter doutor escrito num cartão/ À noite samba no Ó-de-Boro-gódó/ Esqueceu o solidó/ E já não chora a ouvir fado/ Não sei que diga ele era tão desengonçado/ Se o vir já não o quero/ Deve estar um enjoado".

Haverá concertos no Brasil, mas ainda estão a ser acordados.

OS DIÁRIOS DE LUANDINO

Terça-feira à noite na Fundação Gulbenkian foi apresentada uma das obras do ano editorial em Portugal. "Papéis da Prisão: Apontamentos, Diário, Correspondência (1962-1971)", do escritor angolano José Luandino Vieira –que em 2006 recusou o Prêmio Camões– com organização de Margarida Calafate Ribeiro, Mónica V. Silva e Roberto Vecchi (Editorial Caminho).

É a edição dos diários escritos pelo autor enquanto esteve preso "por atividades subversivas", condenado a 14 anos de prisão. O livro cobre o período de 1962-1964 em várias prisões de Luanda e de 1964-1971 no campo de concentração do Tarrafal, em Cabo Verde.

"Assistimos à formação do estilo e da obra de um autor fundacional da literatura angolana, tratava-se de descobrir qual a linguagem em que o povo dos musseques, até aí uma paisagem e pano de fundo da chamada 'literatura colonial', passaria a falar como sujeito de uma pátria nova, em construção", explica seu editor, Zeferino Coelho. Essas páginas, continua ele, dão também "um quadro muito sugestivo da luta dos angolanos pela independência, mas também dos portugueses contra o fascismo".

SEQUEIRA NO LUGAR CERTO

O Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA) quer que 2015 fique na história como o ano em que, pela primeira vez em Portugal, uma obra de arte foi comprada com a ajuda de todos. Entrar num museu e dizer que um bocadinho daquele quadro exposto é nosso?

Prática comum em muitos países, por cá é a primeira vez que acontece. Trata-se do projeto de "fundraising" da obra "Adoração dos Magos" que foi pintada no verão de 1828, em Castel Gandolfo, pelo artista português Domingos António de Sequeira (1768-1837).

A campanha durará até 30/4 ou até que se consigam arrecadar os 600 mil euros necessários para comprar a obra ao seu atual proprietário, um dos descendentes do primeiro duque de Palmela.

O preço do quadro exposto no foyer do museu até abril foi fixado pelo valor que foi segurado na última exposição que integrou –no Palácio Nacional de Ajuda, em 1999.

As contribuições para a compra do quadro podem ser feitas no museu, por transferência bancária ou pelo site sequeira.publico.pt, onde a pintura foi dividida em 10 milhões e 800 mil pixels e pode-se escolher qual parte do quadro patrocinar. Irreverentes, os mecenas modernos dão forma gráfica às suas contribuições, escolhendo pixels de maneira a formar desenhos e nomes, numa espécie de pichação digital –num canto, lê-se ISA; noutro um engraçadinho desenhou seios em uma das figuras.

E CONTANDO...

Desde 27/10, quando começou a campanha, até 23/11, às 9h30, tinham sido arrecadados 60.834,99 euros dos 600 mil necessários para a compra do quadro. Se não conseguir arrecadar o montante total, o dinheiro será usado em outras aquisições para o museu português.

ISABEL COUTINHO, 49, é repórter do jornal português "Público".


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