Folha de S. Paulo


Diário de Nova York - O calendário islâmico

O prefeito Bill de Blasio decidiu adicionar ao calendário letivo das escolas públicas dois feriados consagrados ao islamismo. Católico não praticante, De Blasio disse que a medida é uma maneira de "honrar a contribuição" da comunidade islâmica de Nova York.

Segundo a Universidade Columbia, cerca de 10% do total de 1 milhão de estudantes da cidade são muçulmanos.

Os feriados são o Eid al-Adha ou Grande Festa, em que Abraão oferece o filho em sacrifício a Deus, em vigor a partir de setembro em Nova York, e o Eid al-Fitr, celebração do último dia do Ramadã, que estreará em agosto de 2016.

O novo calendário pode ser visto como uma marca do pluralismo americano em defesa das minorias -alguns distritos nos Estados de Nova Jersey, Vermont e Massachusetts também têm seus feriados muçulmanos. Ou como evidência de que Nova York superou o trauma do ataque às Torres Gêmeas em 2001. No entanto, a decisão contraria o caráter laico da educação na cidade, um dos pilares ideológicos do partido do prefeito democrata. Quem comemora são as crianças, com menos dias de aula.

MACCHIATO

"Race together" não durou uma semana. A grande campanha do Starbucks lançada no mês passado para promover a discussão sobre o racismo provocou uma avalanche de irritação nas redes sociais.

As críticas iam do despreparo dos baristas para falar do tema até a hipocrisia da própria empresa. Segundo os internautas, o alto escalão da maior rede de cafeterias do mundo está composto de brancos, enquanto quem serve as bebidas é negro. Outros diziam que o assunto era indigesto.

Segundo o chefe executivo da Starbucks, Howard Schultz, a ideia surgiu das tensões raciais pelo país, agravadas nos últimos meses com mortes de negros desarmados por policiais brancos, como Eric Garner em Staten Island em julho do ano passado e, no mês seguinte, o jovem Michael Brown, em Ferguson, no Estado de Missouri.

Bem antes da iniciativa do Starbucks no mês passado, a Mix Coffeehaus, um café temporário no bairro do Bronx, questionava a identidade racial dos clientes.

Em lugar de perguntar o nome do cliente, como na rede mundial de cafés, os baristas perguntavam como ele se definia racialmente. A resposta, além da escolha do grão , que podia ser "Uma gota", "Mulato" e "Vira-lata", abria debates sobre o tema. Tudo fazia parte de um projeto da estudante Vernicia Colon para a Parsons the New School for Design. A cafeteria funcionou em abril e em dezembro de 2014.

MACCHIATO 2

Depois do fracasso da campanha de interação do Departamento de Polícia de Nova York com as comunidades da cidade por fotos no Twitter, em que #myNYPD virou palco de imagens violentas da polícia contra o povo, o departamento estreia o IdeaScale.

O software já adotado por diversos órgãos federais, como a Agência de Proteção Ambiental e até mesmo a Casa Branca, lança nova possibilidade de diálogo entre policiais e moradores por meio de debates e votação anônima em ideias e projetos. O recurso talvez gere mais indagações do que respostas, mas já é uma abertura para temas difíceis e seus diagnósticos.

PLUMAS

Mais empolgante do que a exposição de Björk no MoMA é deixar-se absorver pelos cadernos inéditos de Jean-Michel Basquiat no Museu do Brooklyn.

Enquanto a islandesa é decifrada por meio de seus álbuns em um clima encantado de faz de conta, a mostra de Basquiat não precisa de muitos artifícios para firmar sua linguagem irreverente e grafiteira.

O artista que nasceu no Brooklyn e morreu aos 27 anos é uma das vozes mais originais da arte contemporânea. Descobrir esses cadernos é, em si, pura poesia.

No Museu Metropolitan, "The Plains Indians", que vai até maio, é outra mostra imperdível sobre a arte indígena na América do Norte, com belas vestimentas e pinturas sobre couro que retratam danças vitoriosas e animais míticos, oriundas de grandes coleções como a do museu parisiense Quai Branly.

Para quem viu Björk e Basquiat (que terminam, respectivamente, em junho e agosto), a mostra dos indígenas é uma lembrança da sua forte influência sobre a imagética de Basquiat, ou da fascinação pelos rituais tribalistas de Björk, a serpente emplumada do rock.

LUCRECIA ZAPPI, 42, jornalista e escritora, é autora de "Onça Preta" (Benvirá).


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