Folha de S. Paulo


Cult após quase 50 anos, 'Vampir' mostra bastidores de filme do Drácula

Divulgação
Cena de 'Vampir Cuadecuc' (1970), do catalão Pere Portabella; longa acompanha rodagem de
Cena de 'Vampir Cuadecuc', de Pere Portabella, sobre a gravação de 'El Conde Dracula', de Jess Franco

"Vampir Cuadecuc" é um filme fantasmagórico e o fantasma de um filme —ou talvez o fantasma do cinema em si.

Filmado em 1970 pelo catalão Pere Portabella, está entre os filmes de vanguarda mais respeitados dos últimos 50 anos, e sempre foi um dos mais difíceis de encontrar.

Agora, está disponível em DVD, em lançamento da distribuidora britânica Second Run Features, em formato compatível com a maioria dos computadores e aparelhos de DVD, sem código de região.

"Vampir Cuadecuc" foi filmado durante a rodagem de "El Conde Drácula", do espanhol Jess Franco, veículo relativamente modesto para Christopher Lee, dos mais duradouros vampiros das telas.

E pode ser descrito como documentário de produção fortemente impressionista, remake insano do clássico do cinema mudo "Nosferatu", de F. W. Murnau, ou coleção, editada excentricamente, de cenas não usadas na montagem final do trabalho de Franco.

Segundo as notas de Stanley Schtinter no DVD, "cua de cuc" é uma expressão catalã que significa "cauda do verme", e também designa o pedacinho de filme não exposto no final do rolo de película.

Usando uma câmera portátil de 16 milímetros e película de alto contraste, em branco e preto, Portabella filmou as cenas centrais do filme de Franco como se estivesse espionando sua rodagem.

Entre idas e vindas misteriosas que envolvem corridas cinéticas por bosques, o filme enfatiza detalhes como os péssimos marionetes de morcegos que supostamente voam diante da janela de uma mulher prestes a receber as atenções do Conde Drácula.

O som ambiente é quase suprimido em favor de uma partitura do catalão Carles Santos, na qual trovões e sinos se entrelaçam a trechos incongruentemente lânguidos de música de sala de espera.

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Cena de 'Vampir Cuadecuc' (1970), do catalão Pere Portabella; longa acompanha rodagem de
Cena de 'Vampir Cuadecuc', de Pere Portabella, sobre a gravação de 'El Conde Dracula', de Jess Franco

A atmosfera é pelo menos tão importante quanto a ação, no filme. As imagens se dissolvem em sombra; a luz quase sempre é difusa.

O foco de Portabella é mais nítido quando ele mostra preparativos no estúdio, como a produção de névoa artificial, a criação de teias de aranha, a maquiagem que simula mordidas e o posicionamento de atores em caixões.

Tudo é igualmente fantástico. A câmara oficial do filme é mostrada em uma "dolly", espreitando o set de "El Conde Drácula" com a intensidade que Christopher Lee vorazmente espreita suas vítimas.

Dada a posição política de Portabella (ele produziu "Viridiana", comédia ferozmente antirreligiosa de Luis Buñuel), "Vampir Cuadecuc" costuma ser lido como comentário sobre os anos finais da ditadura do general Franco.

Mas também é exemplo de um vampirismo "positivo", extraindo sustento dos fluidos vitais de outro filme. Em termos mais gerais, o de Portabella rumina sobre a vampiresca relação entre cinema e vida (e assim dialoga com o astuto e fascinante "O Vampiro", de Carl Theodore Dreyer, que também acaba de sair em Blu-ray pela Criterion).

O trabalho de Portabella ficou em cartaz por curto período em 1973, sob o título "Vampir". Roger Greenspun, que resenhou o filme para o "New York Times", considerou que vê-lo "vale tanto a pena que é quase obrigatório".

Agora, isso se torna possível.

Tradução PAULO MIGLIACCI

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VAMPIR CUADECUC
DIREÇÃO Pere Portabella
LANÇAMENTO Second Run
Quanto cerca de R$ 44,40 (em amazon.co.uk)


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