Folha de S. Paulo


crítica

Atuação de Noemi Marinho é o ponto alto da peça 'Unfaithful'

Leekyung Kim/Divulgação
Laerte Késsimos (Peter) e Noemi Marinho (Joan) em 'Unfaithful', peça do irlandês Owen McCafferty
Laerte Késsimos (Peter) e Noemi Marinho (Joan) em 'Unfaithful', peça do irlandês Owen McCafferty

UNFAITHFUL (muito bom)
QUANDO sábado, às 21h, domingo, às 19h; segunda, às 21h, até 18/12
ONDE Teatro do Núcleo Experimental (rua Barra Funda, 637, tel. 3259-0898)
QUANTO R$ 20 a R$ 40, 16 anos

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A crise de um casamento de quase 30 anos e os desencontros de um relacionamento em seu início se entrelaçam em "Unfaithful" ("Infiel"), peça do irlandês Owen McCafferty, dissecando a solidão que corre subterrânea a todo convívio e intimidade.

Sem ter a intenção e nem sequer saber, Tom e Joan, na casa dos 50 anos, trocam de parceiros com Peter e Tara, chegando aos 30.

Tom está bebendo uma cerveja após o trabalho quando é abordado por Tara, que se oferece para fazer sexo com ele.

Joan, ao descobrir o encontro do marido, se vinga recorrendo a um garoto de programa, que é o próprio Peter.

A trama é banal, e os cruzamentos, quase forçados; se o ponto de partida de "Unfaithful" pode não entusiasmar, o texto ganha força ao lançar dúvidas paulatinamente sobre o que teria acontecido em cada noite.

Mais interessante ainda é a maneira pela qual desnuda (ou reveste com mais armaduras?) os personagens, quando eles expõem seus motivos para cada decisão.

Assim, Tom volta atrás em sua confissão de traição, e Joan se esquece de mencionar Peter; eles revolvem sua crise trazendo à baila incômodos antigos e recentes, mágoas, vazios, a preocupação com a velhice.

A "DR" do casal de meia-idade, diluída ao longo do espetáculo, é o ponto alto da encenação, a cargo de Lavínia Pannunzio.

A densidade dos conflitos se revela, no texto, a cada nova tentativa dos parceiros de escancarar as feridas.

NÓS QUE ESTRANGULAM

É com a atuação de Noemi Marinho, no entanto, que "Unfaithful" se transforma de uma boa peça sobre relacionamentos em crise para uma exposição potente dos nós que estrangulam a vida em comum. A atriz transita da raiva à vulnerabilidade, e daí à ironia e à reflexão de modo a construir uma personagem complexa e imensamente cativante.

Nos embates com o marido Tom (Helio Cicero), Joan resulta mais disposta a entender e desatar tais nós; no encontro com o garoto de programa Peter (Laerte Késsimos), Marinho está completamente à vontade no constrangimento de Joan, carregando a plateia consigo em suas vacilações.

O casal jovem, vivido por Késsimos e Luna Martinelli, sai prejudicado principalmente pelo texto, que não desenvolve tão bem personagens ou seus diálogos.

Numa montagem de tantas palavras, vale saudar a inteligência de direção e concepção de cenário (Cássio Brasil), que guiam os atores pelos ambientes delimitados por sofás sem que a cena esfrie ou incorra em excessos.


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