Folha de S. Paulo


Crítica

Excesso de advertências limita manual de escrita a iniciantes

TIRANDO DE LETRA (regular)
AUTORES Chico Moura e Wilma Moura
EDITORA Companhia Das Letras
QUANTO R$ 44,90 (208 págs.); R$ 29,90 (e-book)

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Chega às livrarias o volume "Tirando de Letra: Orientações Simples e Práticas para Escrever Bem", de Chico Moura e Wilma Moura.

Como o próprio título explicita, a intenção dos professores é ensinar objetivamente algo que tem boa dose de subjetividade. Eis o desafio que se propuseram.

A dupla, embora se diga tributária de autores da tradição de língua inglesa, como William Zinsser e Stephen Pinker, mencionados aqui apenas os traduzidos para o português (o primeiro foi publicado pelo selo Três Estrelas, da Publifolha; o segundo, pela editora Contexto), parece seguir o bom e velho caminho de terra batida.

Longe de darem ouvidos às críticas de Pinker aos manuais de escrita, os professores não hesitam em reprovar o uso da voz passiva, em recomendar a eliminação de adjetivos e advérbios, em organizar listas de expressões redundantes a evitar etc.

Não que essas advertências não tenham alguma utilidade, mas condenam o livro a ser um manual para iniciantes.

Os autores, é bom que se diga, parecem ter consciência da dificuldade de pôr no papel sua experiência de sala de aula.

Quase tudo o que aconselham numa página aparece relativizado logo em seguida: elimine os advérbios, mas, às vezes, eles são necessários; evite as repetições, mas, às vezes, elas são um recurso expressivo; faça frases curtas, mas cuidado "para que o texto não fique claudicante, parecendo mero somatório de ideias avulsas" —e assim por diante.

No decorrer de um curso, é, por certo, mais fácil mostrar que esses conselhos, ainda que relativamente úteis num primeiro momento, têm valor limitado, coisa que o redator, quando atinge a desejada autonomia, percebe por si mesmo. O problema é saber se essa autonomia de fato chega ao final de tal processo.

Às vezes, tem-se a impressão de que boa parte das "orientações simples e práticas" constitui um punhado de dicas convencionais que nem os próprios autores consideram ao redigir. A verdade é que não há quem escreva bem sem antes ser um bom leitor.

Muito diferente dos guias de língua inglesa citados, o manual de Moura e Moura não vai além do tom escolar, reforçado seja pelo índex de expressões a banir, seja por um modesto apanhado de estrangeirismos traduzidos.

Um capítulo foi dedicado às chamadas "dúvidas recorrentes": uma seleção de 30 dicas de gramática que, segundo estatística dos autores, são as dificuldades mais comuns.

Lá estão os velhos pares de certo/errado, com explicações muito sucintas, simplistas até. Ao dizerem repetidamente que as construções ditas inadequadas ou erradas são recorrentes ou próprias da língua falada, os autores acabam tornando o material vulnerável à crítica hoje feita pela linguística (afinal, se é recorrente, será erro?).

Tirando de Letra
Wilma Moura, Chico Moura
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Imprecisões como identificar língua falada com registro informal ou usar a expressão "norma culta" sem definição (nem mesmo no glossário) fragilizam o conteúdo desse capítulo, que soa burocrático, como de resto ocorre na maioria dos manuais desse tipo, alvo constante de críticas.

Mesmo sem o charme de um Zinsser ou a vivacidade de um Pinker, o livro dos Mouras tem o mérito de trabalhar com simplicidade os defeitos de sintaxe que tanto obstam a fluidez do texto e de propor um caminho para estudantes e candidatos a concursos públicos, motivados mais pela necessidade de elaborar um texto eficiente do que pelo desejo de aprimorar o estilo.


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