Folha de S. Paulo


'Os Pescadores de Pérolas', de Bizet, preenche ano fraco para a ópera

Divulgação
Cena da ópera
Cena da ópera "Os Pescadores de Pérolas"

OS PESCADORES DE PÉROLAS (muito bom)
QUANDO qua. (1º), sex. (3), dom. (5) e seg. (6) às 20h
ONDE Theatro Municipal - Praça Ramos de Azevedo, s/n - República, tel. (11) 3053-2090
QUANTO de R$ 15 a R$60; livre

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Foi em 1995 que o dramaturgo Naum Alves de Souza (1942-2016) –já conhecido àquela altura por espetáculos como "O Grande Circo Místico" e "Falso Brilhante"– dirigiu para o Theatro Municipal de São Paulo a ópera "Os Pescadores de Pérolas", de Bizet (1838-75).

Além da direção cênica, Naum foi o responsável pela criação de cenários e figurinos da produção, que marcou época e foi retomada pela primeira vez dez anos depois.

Agora, por iniciativa do maestro Jamil Maluf e da Orquestra Experimental de Repertório –a orquestra jovem da casa–, o Municipal recupera novamente a montagem, desta vez como homenagem ao encenador, que morreu no ano passado.

Dirigida por João Malatian, a remontagem revela uma concepção leve, colorida e ágil, com unidade e contraste entre os atos. Predominam no cenário as formações rochosas à beira mar –no "longínquo Ceilão", onde se passa a história.

No palco, a natureza se movimenta com sutileza, qualificando o canto. A cena inicial, por outro lado, com os mergulhadores nadando em suspensão, deve ter sido muito mais impactante nos anos 90.

Jamil Maluf controla totalmente o drama, o que quer dizer que não apenas rege com desenvoltura mas tem amplo domínio sobre a narrativa: faz música com o teatro e, simultaneamente, torna os instrumentos personagens.

Na estreia (30) o som foi compacto, com contrastes dinâmicos e belos duetos de violino e viola, flauta e harpa (apesar de que as trompas poderiam soar mais homogêneas na cavatina de Leila, no segundo ato).

Escrita pelo jovem Bizet, a ópera já carrega ingredientes que seriam potencializados, anos depois, na "Carmen".

O Coral Paulistano, preparado por Naomi Munakata, mostrou sonoridade extrovertida e dicção clara e cuidadosa (em francês).

É muito bom constatar o rápido amadurecimento da jovem soprano Camila Titinger (no papel de Leila). Se em 2015 –dirigida no mesmo papel pelo cineasta Fernando Meireles no Theatro da Paz, em Belém– ela revelava qualidades e também alguma timidez diante do forte elenco masculino, agora brilha com personalidade.

Sua voz ganhou sutilezas e requintes, e não seria demais afirmar que ela já é uma de nossas melhores cantoras.

O tenor Gustavo Quaresma (como Nadir) não esteve muito à vontade na estreia, especialmente no primeiro ato, mas é possível que sua performance evolua ao longo das próximas récitas.

Já o barítono David Marcondes fez um emocionante e expressivo Zurga, de voz madura e poderosa, além de mostrar refinamento teatral, enquanto o baixo Matheus França saiu-se muito bem como Nurabad.

Em um ano fraco para a ópera em São Paulo –de fato, pela primeira vez em tempos não houve temporada lírica anunciada na cidade– essa remontagem-homenagem ocupa um importante espaço, e o faz sem soar pretensiosa.


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