Folha de S. Paulo


CRÍTICA

Villeneuve supera as expectativas em 'Blade Runner 2049'

BLADE RUNNER 2049 (ótimo)
DIREÇÃO Denis Villeneuve
ELENCO Harrison Ford, Ryan Gosling, Jared Leto
PRODUÇÃO EUA, Reino Unido, Canadá, 2017, 14 anos
QUANDO estreia nesta quinta (5)
Veja salas e horários de exibição

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"Blade Runner –O Caçador de Androides" (1982) faz parte do pequeno conjunto de obras que não revolucionaram o cinema, mas condensaram o espírito de uma época, captaram de modo agudo as questões e refletiram um imaginário de modo tão peculiar que se tornaram únicas.

O tempo não as envelhece e as releituras agregam complexidades antes invisíveis. Por isso, quem cultua o filme teve motivos para temer a ideia de uma continuação.

Mas "Blade Runner 2049" ultrapassa toda as expectativas, graças à inteligência com que Denis Villeneuve apropria-se do projeto, com uma ousadia que desmente quem até agora o considerava somente um esteta.

Não se trata de repaginar um filme nem de fazer de conta que o tempo não passou. Os 35 anos que nos distanciam do original e os 32 que nos separam do novo futuro nos colocam num lugar inquietante, num presente que sabe ser impossível recuperar o passado e que prevê um porvir cada dia mais negativo.

Villeneuve aproveita essa distância para criar um filme que dialoga com o original sem se subordinar a ele e transpõe sua ambição filosófica para hoje. Enquanto lá o trágico era a impossível humanização dos replicantes, agora o humano não existe mais, sumiu num apagão, e o que sobrou não faz sentido.

O que um dia foi já era, só sobraram fragmentos, as memórias nem são mais resíduos com os quais construir histórias. K (Ryan Gosling, formidável em sua beleza opaca) vagueia atônito por esse mundo sem referências, impalpável, no qual não há mais origens, identidades e tudo tem a densidade dos espectros.

K salta entre as situações sem encontrar em que se apoiar, segue enigmas que levam a abismos dentro de abismos, aprofundando uma vertigem existencialista que já sombreava o primeiro filme.

O filme adota uma estrutura narrativa indeterminada, rica em lacunas e vácuos, uma anomalia para os padrões hollywoodianos.

A dimensão visual, ponto alto do filme de 1982, aqui está a serviço do todo em vez de ser a única atração, como tem sido tão comum nos blockbusters contemporâneos. O deslumbramento, contudo, não é onipresente, o que torna ainda mais intensos os momentos de impacto sensorial.

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Assista ao trailer de 'Blade Runner 2049'

Assista ao trailer de 'Blade Runner 2049'


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