Folha de S. Paulo


Com erros e acertos e protestos, Rock in Rio valoriza 'experiência'

Poucos festivais conseguiriam sobreviver a um desfalque como o que o Rock in Rio 2017 sofreu na véspera da abertura dos portões: a americana Lady Gaga, mais relevante das atrações na atualidade, cancelou seu show por motivos de saúde.

E, no entanto, após sete dias de evento, concluídos neste domingo (24), a ausência da estrela virou um detalhe. Porque, no Rock in Rio, a música é isso: apenas parte de uma "experiência" muito maior, como desejava seu criador, o publicitário Roberto Medina.

Em sua sétima edição nacional, o festival diluiu ainda mais a importância dos shows, acrescentando duas arenas de games, sempre cheias, e um palco para "youtubers" —que não tiveram tratamento à altura de sua popularidade on-line, com som baixo e horários restritos, encerrando às 19h.

A escalação do palco principal foi marcada pela repetição: com exceção do The Who, os "headliners" (Maroon 5, Justin Timberlake, Aerosmith, Bon Jovi, Guns n' Roses e Red Hot Chili Peppers) eram todos veteranos do festival ou visitantes frequentes do país.

Distribuídos em dois finais de semana temáticos —o primeiro, mais pop/dance; o segundo, mais rock—, eles foram do memorável (The Who) ao esquecível (Maroon 5), mas sempre com padrão de profissionalismo e qualidade.

Um dos shows mais aguardados e mais lotados, o do Guns n' Roses, no último sábado (23), foi também o mais longo da história do festival, com quase três horas e meia de duração –isso apesar do vocalista Axl Rose mal ter voz para metade deste tempo.

Dois ícones dos anos 1980 quase esquecidos —Pet Shop Boys e Tears for Fears— animaram a plateia saudosista. Bon Jovi e Timberlake fizeram shows perfeitos para os fãs, e nem tanto para a crítica.

Depois da ausência de Lady Gaga, a mais comentada foi a de Anitta, cujos fãs fizeram campanha para vê-la no festival, cobrindo a saída da americana —e acompanhada da diva Pabllo Vittar, cuja simples aparição para um pocket show no estande de um dos patrocinadores tornou-se um dos fenômenos da edição.

O palco Sunset, cuja escalação é mais baseada em méritos artísticos do que comerciais, respondeu por alguns dos melhores momentos, como os bailes dançantes deNile Rodgers e CeeLo Green.

Seu show mais esperado, no entanto —o encontro de Ney Matogrosso com a Nação Zumbi—, causou reações mistas: muitos acharam que não deu liga.

FESTIVAL DE PROTESTOS

Essa edição do Rock in Rio também será lembrada como a mais política do festival —superando até a primeira, em 1985, que aconteceu em pleno movimento de redemocratização do país.

Desta vez, com o Brasil e o Rio em aguda crise política e econômica, os protestos foram diários —praticamente todos os artistas brasileiros fizeram alguma menção, e mesmo alguns estrangeiros, como os americanos Alicia Keys e CeeLo Green.

A cantora, que fez um dos melhores shows do primeiro fim de semana, engajou-se na luta pela preservação da Amazônia, levando ao palco a líder indígena Sônia Guajajara. A modelo Gisele Bündchen ergueu bandeira semelhante na abertura.

Houve ainda manifestações contra o preconceito sexual —"Amar sem temer" foi um bordão repetido nos shows de Ana Cañas e deJohnny Hooker, que deu um beijo na boca de seu convidado, Liniker—, contra o racismo e contra a violência na favela da Rocinha, que foi palco de confronto de traficantes durante o festival.

Mais do que tudo, no entanto, o que se ouviu em vários shows, todos os dias, foram os gritos de "fora, Temer", contra o Presidente da República.

Já a Cidade do Rock dobrou de área, ocupando o Parque Olímpico da Barra —e mostrando uma possível solução para aquele imenso espaço ocioso.

A ocupação do latifúndio, no entanto, pode ser melhorada. Os dois palcos principais ainda estavam próximos um do outro, o que congestionou a área entre eles nos shows mais populares.

*

Deu certo:

1. A escalação do The Who, inédito no Brasil e ainda em boa forma.

2. Bebedouros gratuitos em maior quantidade, salvação nos vários dias de calor.

3. Cidade do Rock com o dobro do tamanho permitiu circulação melhor.

4. Arenas da Game XP e Digital Stage deram mais opções para quem chegava.

5. Metrô 24h e ônibus do BRT facilitando o acesso ao festival.

6. A presença (surpresa) de Pabllo Vittar em pocket show e como convidada de Fergie.

7. Encontros de artistas brasileiros mostrou cena nacional consistente e foi bom aquecimento.

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Deu errado:

1. A ausência de Lady Gaga, por motivos de saúde.

2. Palcos Sunset e Mundo ainda muito próximos causaram congestionamentos nos shows mais populares.

3. Problemas de som atrapalharam Fergie, Maria Rita, Guns N' Roses, Offspring e outros.

4. Onda de furto de celulares durante show de Alicia Keys.

5. Vigilância sanitária barra produtos, e chef Roberta Sudbrack fica fora do evento.

6. A ausência (oficial) de Pabllo Vittar no line-up dos palcos principais —assim como de Anitta.

7.Falha na montanha-russa impediu atração durante uma das noites mais cheias.


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