AS DUAS IRENES (bom)
DIREÇÃO Fabio Meira
PRODUÇÃO Brasil, 2017, 14 anos
ELENCO Isabela Torres, Priscila Bittencourt e Marco Ricca
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Muitos filmes nascem de histórias, enquanto outros surgem de uma imagem forte ou enigmática. Além dessas situações, a revelação de uma face também pode ser o elemento que dá vida e corpo a uma ficção. A força principal de "As Duas Irenes" vem desse achado.
Fabio Meira, em seu primeiro longa, confirma a inquietude frequente na jovem geração de cineastas brasileiros, a vontade de expandir caminhos e não apenas de requentar, recusando "fórmulas que funcionam".
Como muitos filmes de estreia, esse também pode ser descrito como um trabalho de descobertas. De um lado, temos o diretor que busca se afirmar sem deixar de evocar filiações e referências.
Em vez de se fixar na moldura muitas vezes estreita demais do filme de época, por exemplo, Meira explora a inventiva direção de arte para revelar facetas de uma opressão tanto física como mental.
De outro, a história se centra em personagens que se descobrem, ao despertar para as novidades que vêm do corpo, do sexo e da paixão.
A adolescência típica de Irene (Priscila Bittencourt) a coloca em meio a muitas dúvidas. Ela não tem mais segurança acerca do afeto dos pais e sua graça de menina se perde quando contrastada à irmã mais velha, que está virando mulher, e à mais nova, ainda criança.
A instabilidade com que a garota percebe esse mundo próximo vira abalo quando ela descobre que o pai tem outra família e uma filha da mesma idade dela, também chamada Irene (Isabela Torres).
Essa outra é um reflexo e também uma imagem invertida. Enquanto o corpo da primeira ainda não se alterou, a segunda já tem as formas e a libido da puberdade. Entre as duas cria-se então um jogo que mistura imagens, desejos, invejas e ciúmes.
A descoberta das duas atrizes estreantes é a condição que o diretor aproveita para expandir essa boa ideia de roteiro em cinema.
O modo como explora os corpos, olhares e gestos leva o filme além da verossimilhança psicológica para propor um mais ambicioso estudo da alma, de seus mistérios e não-ditos.
O cinema lacunar, desinteressado em dar explicações, funciona muito bem aqui, pois não se trata de decifrar ou demonstrar o que se passa no interior das personagens.
A ambição maior é pintar as tonalidades, as angústias que não se traduzem, um esforço subterrâneo que o filme alcança sem precisar vestir a fantasia de "difícil".
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Assista ao trailer de 'As Duas Irenes'
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