Folha de S. Paulo


CRÍTICA

Com atuações sublimes, 'Deserto' é para quem ainda prefere poesia

DESERTO (muito bom)
DIREÇÃO Guilherme Weber
ELENCO Lima Duarte, Magali Biff, Cida Moreira, Everaldo Pontes, Pietra Pan, Fernando Teixeira
PRODUÇÃO Brasil, 2016, 14 anos
QUANDO estreia nesta quinta (14)
Veja salas e horários de exibição.
p(star). *

Como ator, Guilherme Weber permaneceu por cerca de 20 anos na Sutil Companhia de Teatro, fundada por ele e pelo diretor Felipe Hirsch em Curitiba, em 1993. Formaram uma das parcerias mais inventivas dos palcos brasileiros nas últimas décadas.

Mais adiante, depois de incursões bem-sucedidas como diretor de teatro, em peças como "Os Realistas" (2016), Weber lançou-se como cineasta com "Deserto", que agora entra em cartaz.

É natural, portanto, que sua estreia na condução de um longa gere expectativa entre aqueles que acompanham sua trajetória. Mesmo esses tendem a se surpreender com o resultado.

Inspirado no romance "Santa Maria do Circo", do mexicano David Toscana, "Deserto" nos leva a um sertão indeterminado.

Trailer

Exaurida pela falta de água e, sobretudo, de público, uma trupe de atores decide interromper as andanças para se estabelecer numa vila abandonada.

O grupo conclui que uma nova sociedade só seria viável se distribuíssem ofícios entre si. O sorteio de papeis dá às mulheres as funções de médica, cozinheira e caçadora. Os homens ficam com os encargos de padre, militar, puta e negro, definido como "aquele que faz as coisas que ninguém quer fazer".

ALEGORIA

"Deserto" explora temas como religião e preconceito, mas há duas questões que percorrem todo o filme, sempre sob o viés alegórico. Como os atores podem transformar a vida das pessoas? E principalmente: quais os princípios que regem o nascimento de uma comunidade ou, por que não, de um país?

Ainda que seja potente, a mise-en-scène não basta para dar corpo a essas discussões. Para tanto, há o elenco, cuidadosamente escolhido por Weber. Magali Biff e Cida Moreira se sobressaem, mas cabe a Lima Duarte a passagem mais sublime.

Embriagado, o líder da trupe, vivido pelo ator de 87 anos, comenta a velhice e o descaso com a arte em um solo de seis minutos.

"As pessoas não querem mais poemas, querem estribilho", lamenta o personagem de Lima Duarte. "Deserto" é para quem ainda prefere poesia.


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