Folha de S. Paulo


CRÍTICA

Filme 'Como Nossos Pais' se destaca pela naturalidade

Divulgação
Cena do filme 'Como Nossos Pais
Cena do filme 'Como Nossos Pais'

COMO NOSSOS PAIS (muito bom)
DIREÇÃO Laís Bodanzky
ELENCO Maria Ribeiro, Clarisse Abujamra, Paulo Vilhena
PRODUÇÃO Brasil, 2017
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Em meio à instabilidade histórica da produção de filmes no Brasil, o cinema do país enriquece, aos poucos, um filão em que os europeus já exibem uma tradição consolidada ao longo de décadas.

São os dramas que se concentram na intimidade das relações familiares. No cinema brasileiro, "Eles Não Usam Black-Tie" (1981) e "Lavoura Arcaica" (2001) estão entre os expoentes dessa vertente.

"Como Nossos Pais", de Laís Bodanzky, fortalece essa trilha, conciliando temas ancestrais, como a ligação entre mãe e filha, e questões contemporâneas, caso de anseios e conflitos da mulher neste século, que constituem uma nova (e bem-vinda) onda feminista.

"Não quero mais fingir que sou uma mulher que dá conta de tudo. Eu não dou conta de tudo", desabafa Rosa, a jornalista vivida por Maria Ribeiro.

Aos 38 anos, a protagonista é filha de pais divorciados, ambos intelectuais da classe média paulistana. Emergem novas camadas de sentimentos, sempre ambíguos, na relação dela com a mãe (Clarisse Abujamra), que descobre ter uma doença grave.

Talvez por insegurança, Rosa reconhece ser mais careta que os pais, característica que molda sua convivência com as duas filhas, crianças próximas da adolescência.

Mas a crise da personagem não se limita à condição de filha e mãe. O casamento com o antropólogo Dado (Paulo Vilhena) está prestes a ruir. No mais, ela sustenta a casa com um trabalho que a frustra enquanto sufoca o desejo de se tornar dramaturga.

Algumas mulheres que leem este texto se identificarão com a protagonista. Ou verão suas amigas espelhadas na personagem. Laís Bodanzky, com 47 anos, e Maria Ribeiro, 41, enfrentam dilemas muito semelhantes aos de Rosa.

Não se trata de uma construção cujo trunfo seja a originalidade. "Como Nossos Pais" se distingue da maior parte dos dramas familiares pela naturalidade expressa nas situações de intimidade e riqueza de matizes a conduzir cada personagem. O filme nos põe dentro do núcleo familiar.

Sinais sutis conduzem a transformação de Rosa, o que exigia de Maria modulação da sensibilidade. Uma carga emotiva em excesso ou um tom mais austero da atriz resultariam noutro filme, certamente menos interessante.

Também é notável o desempenho de Clarisse Abujamra como uma mãe impetuosa, que não se constrange pela trajetória à margem das convenções.

Diretora de filmes como "Bicho de Sete Cabeças" e "As Melhores Coisas do Mundo", Laís Bodanzky se firma como uma cineasta do seu tempo, especialmente atenta às particularidades do comportamento. Não é pouca coisa.


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