Folha de S. Paulo


No centenário da Revolução, teatro ressalta viés político de autores russos

Lenise Pinheiro/Folhapress
Sao Paulo, SP, Brasil. Data 02-08-2017. Espetáculo TcheÌkhov EÌ um Cogumelo (Ensaio). Atrizes Helena Ignez (esq), Djin Sganzerla (centro) e Michele Matalon (dir). Espaço Lusco Fusco. Foto Lenise Pinheiro/Folhapress
Helena Ignez (esq), Djin Sganzerla (centro) e Michele Matalon em ensaio de Tchékhov É um Cogumelo

No ano de celebração do centenário da Revolução Russa, o teatro se volta a autores do país. Em especial, debruça-se sobre o viés político de algumas obras e sobre como alguns escritos do início do século 20 ecoam ainda hoje.

"A Plenos Pulmões", em cartaz no CCBB paulistano, se apoia nos versos de Vladimir Maiakóvski (1893-1930), "o poeta da revolução, mas também um revolucionário da linguagem e da poesia", segundo a diretora Marcia Abujamra, que também assina o roteiro do espetáculo.

O ator Luciano Chirolli interpreta o poeta, ressaltando como Maiakóvski, um militante político que produzia cartazes para o regime, também conseguia viver a poesia.

Ele é acompanhado no palco por Georgette Fadel, que ora faz o papel das mulheres do autor, ora de uma leitora contemporânea do poeta. "Queríamos contextualizar o momento político em que ele vivia", conta Abujamra.

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Sao Paulo, SP, Brasil. Data 24-07-2017. Espetáculo A Plenos Pulmões. Atores Luciano Chirolli (esq) e Georgette Fadel (dir).Teatro Centro Cultural Banco do Brasil. Foto Lenise Pinheiro/Folhapress
Atores Luciano Chirolli (esq) e Georgette Fadel (dir) em cena de "A Plenos Pulmões", no CCBB paulista

"É muito louca a atualidade dele", diz ela, que compara o tempo do poeta ao de hoje. "A gente também está vivendo um grande momento de crise e transformação."

"O momento político hoje é muito parecido com o daquela época, de ascensão e esperança de um poder político e [posterior] decepção com ele", afirma Chirolli, referindo-se aos anos de PT.

JARDIM

A crise do poder político também é o tema de "Kiev", que o diretor Roberto Alvim estreia esta semana. É uma montagem da obra do uruguaio Sergio Blanco, que faz uma espécie de continuação de "O Jardim das Cerejeiras", de Anton Tchékhov (1860-1904), retrato do declínio da aristocracia.

Blanco coloca o texto cem anos após a obra do russo. Passado o mandato de Stálin, uma família retorna a uma das casas de veraneio que, no original tchekhoviano, derrubou um campo de cerejeiras.

Ali, se depara com as atrocidades do regime –como uma pilha de corpos na piscina da casa–, mas fecha os olhos para a violência e os males do stalinismo.

Para Alvim, não se trata de uma crítica a movimentos de esquerda ou de direita, mas à política como um todo.

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Sao Paulo, SP, Brasil. Data 02-08-2017. Espetáculo Kiev. Atores Filipe Ribeiro (esq), Juliana Galdino, Tatnã Marquezone e Otávio Martins. Teatro Sesc Ipiranga. Foto Lenise Pinheiro/Folhapress
Atores Filipe Ribeiro (esq), Juliana Galdino, Tatnã Marquezone e Otávio Martins em "Kiev"

"Tudo é sobre o poder e a acumulação de cadáveres", diz ele, que cobre o palco com obras de artistas massacrados pelo regime –ainda que o apoiassem.

À esquerda, uma reprodução de "Monumento à Terceira Internacional", escultura de Tátlin. Ao fundo, "Quadrado Negro sobre Fundo Branco", de Malevich, é tanto o ícone da arte suprematista como metáfora da piscina, coberta com a bandeira socialista para esconder os corpos de vítimas ali acumulados.

COGUMELO

Já "Tchékhov É um Cogumelo", que estreia em 25/8, ressalta a estagnação das personagens de "As Três Irmãs", do dramaturgo russo.

O diretor André Guerreiro Lopes trabalha com a memória, colocando em cena três gerações de atrizes: Djin Sganzerla, Michele Matalon e Helena Ignez (mãe de Djin).

Ele também projeta trechos de uma entrevista que fez nos anos 1990, quando ainda era estudante, com o diretor Zé Celso. O assunto é a versão do Teatro Oficina, de 1974, para a peça de Tchékhov.

Por último, insere uma camada performática: o próprio diretor utiliza um capacete com eletrodos, e sua atividade cerebral é transformada em vídeo, projetado sobre o palco –uma forma de ligar, por meio de sua memória, toda essa linha do tempo.

"Tudo isso para falar do agora", explica o diretor, que compara o estado de apatia das três irmãs tchekovianas com o Brasil atual. "A gente está passando por um momento confuso, de transformações que não são claras."

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KIEV
QUANDO sex. e sáb., às 21h; dom. feriados, às 18h; até 10/9
ONDE Sesc Ipiranga, r. Bom Pastor, 822, tel. (11) 3340-2000
QUANTO R$ 9 a R$ 30
CLASSIFICAÇÃO 14 anos

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A PLENOS PULMÕES
QUANDO sex., sáb. e seg., às 20h; dom., 19h; até 18/9
ONDE CCBB, r. Álvares Penteado, 112, tel. (11) 3113-3651
QUANTO R$ 20
CLASSIFICAÇÃO 12 anos

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TCHÉKHOV É UM COGUMELO
QUANDO sex. e sáb., às 21h; dom., às 18h; de 25/8 a 8/10
ONDE Sesc Consolação, r. Dr. Vila Nova, 245, tel. (11) 3234-3000
QUANTO R$ 12 a R$ 40
CLASSIFICAÇÃO 14 anos


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