Folha de S. Paulo


Peça sobre abusos a mulheres alterna memórias e desabafos

Lenise Pinheiro/Folhapress
Imagem do espetáculo 'Enquanto Ela Dormia', com a atriz Lucienne Guedes
Imagem do espetáculo 'Enquanto Ela Dormia', com a atriz Lucienne Guedes

Dora quer trocar de nome. Ou melhor, quer tirar o sobrenome que herdou da família paterna. Não que ache feio o Beute, de origem alemã. É que, depois de presenciar uma cena de abuso num ônibus, começa a ter consciência do abuso que ela mesma sofria de seu pai durante a infância.

As memórias da professora de literatura Dora (interpretada por Lucienne Guedes) e as histórias de mulheres que sofreram abuso guiam "Enquanto Ela Dormia", espetáculo que estreia nesta semana com direção de Eliana Monteiro (do Teatro da Vertigem) e texto de Carol Pitzer, criado dentro do núcleo de dramaturgia do Sesi-British Council.

Enquanto remói as lembranças do abuso ("você já teve a sensação de que a sua memória não é sua? Tem alguma coisa errada, você não sabe o que é, mas tem alguma coisa errada"), a personagem tenta na Justiça a troca de nome.

Mas ela esbarra na legislação, que não permite à personagem tirar o nome do pai, único que consta em seu registro, e trocá-lo pelo da mãe.

A narrativa ainda cria paralelos com contos de fada, uma espécie de válvula de escape para a situação de violência, personagens de tragédias gregas, como Antígona e Medeia, e a obra da fotógrafa americana Francesca Woodman –que registrava corpos femininos desfocados ou mesclando-se ao ambiente.

AMPUTAÇÃO

Durante a criação do espetáculo, a equipe listou uma linha do tempo de várias "amputações", como chamou as repressões a mulheres, na história da humanidade.

Foi da tradição chinesa do pé de lótus (de quebrar e amarrar os membros para que fiquem pequenos) até pequenas represálias existentes hoje, como comentários e piadas de cunho machista. "Percebi que eu nunca tinha me dado conta das minhas próprias amputações", comenta Eliana.

A ação de de "Enquanto Ela Dormia" se passa dentro do cenário-instalação de Marisa Bentivegna: uma caixa formada de vidros, janelas e grades, que lembram uma casa, mas também uma prisão.

No chão, um espelho d'água (representação da memória e das lágrimas da personagem) que molha a atriz e reflete algumas projeções, de fotos e frases.

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ENQUANTO ELA DORMIA
QUANDO qua. a sáb., às 20h30; dom., às 19h30; até 22/10
ONDE Centro Cultural Fiesp - mezanino, av. Paulista, 1.313, tel. (11) 3528-2000
QUANTO grátis (reservas pelo site centroculturalfiesp.com.br )
CLASSIFICAÇÃO 16 anos


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