Folha de S. Paulo


crítica

Ambição narrativa do roteiro de 'Faces de uma Mulher' não funciona

Divulgação
Sandra (Adèle Exarchopoulos) e Tara (Gemma Arterton) em cena de 'Faces de Uma Mulher', filme de Arnaud des Pallières
Sandra (Adèle Exarchopoulos) e Tara (Gemma Arterton) em cena do filme de Arnaud des Pallières

Faces de uma Mulher (regular)
(Orpheline)
DIREÇÃO Arnaud des Pallières
ELENCO Adèle Haenel, Adèle Exarchopoulos, Gemma Arterton
PRODUÇÃO França, 2016, livre
QUANDO estreia nesta quinta (25)

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Certos filmes, por sua ambição narrativa, funcionam melhor na forma escrita do que depois de prontos. "Faces de uma Mulher" é um desses casos em que o roteiro sugere muitas possibilidades, mas o que se vê na tela parece inacabado e mal resolvido.

A ideia parte de uma personagem e explora múltiplos aspectos da condição feminina, tais como exploração, submissão, abandono e abusos.

Primeiro, vemos Renée (Adèle Haenel), professora numa escola onde tem de lidar com um menino abandonado pela mãe. Em paralelo, surge Tara (Gemma Arterton), que está sendo liberada da prisão e que invade o cotidiano de Renée, revelando um passado criminal oculto.

Esse núcleo é interrompido e retomado adiante, com outros fragmentos do que vai suceder com Renée.

Em seguida, aparece Sandra (Adèle Exarchopoulos), uma jovem que vive de favores de homens mais velhos e que a certa altura também se envolve com Tara, sugerindo um paralelismo com Renée. Sandra logo some do mapa para dar lugar a Karine, adolescente de 13 anos que vive fugindo de casa. Por fim, surge a garotinha Kiki, que passa a se comportar de forma estranha após o sumiço de amigos.

Essa estrutura sucessiva envolve a reaparição de figuras masculinas, que conectam uma história à outra, sugerem uma continuidade entre as diversas personagens.

Elas são interpretadas por atrizes diferentes fisicamente, mas identificadas por abusos comuns. Podem ser uma só mulher em momentos distintos da vida ou pontos de vista diversos da mulher representada como essência.

A tradução dessa estrutura para a narrativa cinematográfica traz problemas na forma da exposição do tempo, isto é, na ordenação entre o que veio antes e o que virá depois, na relação do enquanto isso com o naquele momento.

O opção do diretor é expor em linearidade, utilizando o percurso de Renée como fio narrativo. Isso transforma o filme numa série bem irregular de episódios. Alguns são intensos, como o trecho com a sempre magnética Adèle Exarchopoulos, outros, pretensos, como a longa fuga de Renée, personagem à qual a excelente Adèle Haenel fica longe de dar tudo que tem.


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