Folha de S. Paulo


Celebridades de Hollywood sucumbem a franquias e atraem menos público

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Cena do longa 'Dois Caras Legais', com Russel Crowe e Ryan Gosling
Cena do longa 'Dois Caras Legais', com Ryan Gosling e Russel Crowe

Hollywood juntou Jake Gyllenhaal e Ryan Reynolds, lançou-os no espaço no filme "Vida" e, ainda assim, os galãs não foram capazes de ofuscar o monstro computadorizado de "A Bela e a Fera".

Eles também comeram poeira dos heróis coloridos de "Power Rangers" e até do gorilão de "Kong: Ilha da Caveira". Na semana de estreia, no final de março, "Vida" amargou um nada honroso quarto lugar nas bilheterias americanas, atrás até de filmes que já estavam em cartaz.

O infortúnio acompanha outros medalhões hollywoodianos. Pense no maior galã hoje. Ryan Gosling, talvez?

Nem mesmo quando "Dois Caras Legais" o reuniu com Russell Crowe, foi Gosling páreo para deter o voo dos passarinhos raivosos de "Angry Birds", filme originado de um jogo de celular. Perdeu até para o
besteirol "Vizinhos 2".

As musas Scarlett Johansson e Jennifer Lawrence, o herói do momento Chris Pratt e até o consolidado Brad Pitt, já não chamam mais público se têm diante de si uma franquia ou título que tem alguma ressonância na cabeça do público. Pense em super-heróis, adaptações de videogames e até versões em carne e osso de desenhos clássicos.

O alerta soa sobre o chamado "star system", um dos maiores pilares de Hollywood —a ideia glamorosa de que os atores de filmes são seres maiores que a vida e dotados de persona que enche não só as telas como também as salas de cinema. "Star system".

Marlon Brando, Marilyn Monroe, Cary Grant e Grace Kelly são alguns dos nomes dessa máquina criada no século passado pelos estúdios para chamar público. Quando os grandes estúdios entraram em colapso a partir dos anos 1950 e 1960, o brilho dos astros continuou sendo um chamariz de espectadores, sendo realimentado por novos nomes a cada geração.

Até agora.

"Nos dias de hoje é o conceito que reina", diz Karie Bible, analista de bilheterias na ERC Box Office, que produz relatórios sobre o desempenho de filmes e observa tendências. Ela cita megafranquias como "Harry Potter" e "O Senhor dos Anéis", surgidas no começo deste século, como as impulsionadoras da corrosão do "star system".

"São produções ancoradas mais no conceito e no material do que nos atores", diz.

Estrelas decadentes

MENOS ORIGINAIS

Junte à geleia geral o peso da Marvel e outros estúdios que têm investido na criação de seus próprios universos temáticos e a mudança dos hábitos diante de Netflix e afins, e o próprio calendário de estreias, hoje mais competitivo.

A partir de maio começa o Verão Americano, quando saem os maiores blockbusters, animações e filmes de franquia. De setembro a dezembro, o ano é tomado por longas de olho em garantir vaga no Oscar. Como miram um mesmo (e limitado) público, muitos se canibalizam.

Sobra um período curto —os quatro primeiros meses— em que todos os filmes que não se encaixam nas categorias anteriores se digladiam.

Tratando da crise no cinema como um todo, a revista "Vanity Fair" é apocalíptica: "Hollywood como a conhecemos não existe mais". E acrescenta a fala de um produtor não identificado: "Antes, estrelas podiam fazer um filme. Hoje, elas podem feri-lo".

De olho no mau desempenho de "Vida", a revista "Vulture" aponta para a dificuldade que Hollywood tem hoje em emplacar um produto sem lastro em game, quadrinhos ou filme previamente lançado.

Nos últimos três anos, só três filmes realmente originais tiveram êxito excelente: "Sniper Americano" (2014), "Perdido em Marte" (2015) e "Estrelas Além do Tempo" (2016)

Enquanto "Vida", que estreia na próxima quinta (20) no Brasil, é uma história original sobre astronautas, o gênero da ficção científica, do qual faz parte, terá em 2017 ao menos outras quatro obras "requentadas": "Planeta dos Macacos", "Alien", "Star Wars" e "Blade Runner".

"Passageiros", outra original, teve o trunfo de juntar um casal de atores requisitados (Chris Pratt e Jennifer Lawrence) e arrecadou US$ 100 milhões —pouco, se considerarmos que só o salário da atriz foi de US$ 20 milhões.

Em 2009, ao jornal "The Independent", Peter Guber, ex-presidente dos estúdios da Sony, notava sinais de desgaste: "Pessoas supertalentosas estão falhando em agregar público e todo mundo está se perguntando o porquê?".

Seis anos depois, a indústria ainda não achou saída para seu conjunto de estrelas.

Já o novo "A Bela e a Fera", marca para lá de conhecida, e que esconde o rosto de Ewan McGregor, Emma Thompson e Dan Stevens por trás de pesada computação, cruzou a barreira do US$ 1 bilhão e já está entre as 30 maiores bilheterias de todos os tempos.


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