Folha de S. Paulo


Crise e falta do que falar fizeram grifes atolarem no visual 'saldão'

A edição da São Paulo Fashion Week que terminou na sexta (17) atirou para todos os lados, inclusive nela própria. Embora tenha dado espaço para tendências que o consumidor comprará nos próximos meses, preteriu valores que a tornaram a semana de desfiles mais importante do país.

Pouca criatividade, nenhuma novidade e apresentações capengas resumem o modelo adotado pela maioria das marcas, que apresentaram um rescaldo das últimas temporadas internacionais e, mesmo assim, quase não foram além da roupa mediana encontrada em qualquer "saldão".

Poucos "causaram" ou fizeram ser vistos pelo novo. A ordem agora é vender tudo. A prática do "veja agora, compre agora", novo modelo adotado pelo evento para estimular vendas -porque a roupa vista hoje, amanhã estará nas lojas-, pintou o desastre.

No início da temporada, a impressão era de que as marcas estariam recuperando seus estilos, com "looks" básicos inspirados em suas trajetórias. Ficou claro, porém, que o artifício era desculpa para a falta do que falar e servia como embalagem para o medo de assumir riscos.

O vestido de sarja, a bermuda e o moletom de todo dia são facilmente encontrados na loja de "fast-fashion" mais próxima. Essas roupas não deveriam estar na passarela, a não ser que contassem uma história de herança brasileira, como fez, por exemplo, o "streetwear" de gafieira da LAB.

Ou que servissem de palanque para uma mudança de pensamento, como fez a À La Garçonne ao questionar os pudores envolvidos na exposição do corpo a partir de roupas fetichistas que, embora cheirassem a sexo, não mimetizaram um erotismo gratuito.

Faltaram mais estilistas como o mineiro Luíz Cláudio, da grife Apartamento 03, que conseguiu imprimir elegância e absoluto senso de beleza em roupas de arquitetura disforme e bordados preciosos.

A imagem do desfile não é simples, mas guarda todos os traços de uma roupa feita com esforço intelectual e esmero na execução, valores sacros para quem espera algo a mais de marcas criativas -e caras.

Não é demérito nenhum criar para vender, porque só assim as ideias têm valor e o mercado se alimenta. Mas tentar cobrir o nada com uma capa de glamour é atentar contra a inteligência dos clientes.


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