Folha de S. Paulo


Crítica

Mostra do Masp sobre Avenida Paulista é formalista e asséptica

Divulgação
Fotografia de Carlos Fadon, que está em mostra sobre a avenida Paulista no Masp
Fotografia de Carlos Fadon, que está em mostra sobre a avenida Paulista no Masp

A relação de uma instituição com seu contexto é essencial, especialmente no caso do Museu de Arte de São Paulo (Masp), com sua arquitetura marcada pela transparência, portanto o desejo de estar em contato com seu exterior. Nesse sentido, "Avenida Paulista", mostra com seis curadores inaugurada na semana passada, poderia representar um novo passo na direção artística da instituição, que, nos últimos dois anos, vem repetindo projetos de Lina Bo Bardi.

Contudo, por mais que se incense a arquiteta italiana, seus arrojados dispositivos expositivos e sua aberta concepção de museu valem no discurso, mas não na prática. Isso porque "Avenida Paulista", justamente um dos espaços públicos mais pulsantes da cidade, a arena dos conflitos, seja do embate entre ciclistas e motorizados às manifestação de todas as tendências, é uma mostra formalista e asséptica, ou seja, o oposto do que se vive na rua.

A mostra abarca, é verdade, uma pesquisa extensa e ampla da iconografia da Paulista, que parte da primeira imagem da avenida _a aquarela de 1891 de Jules Martin, representando a festividade de sua inauguração, e segue por mais de um século até a coleção de todos os pôsteres da Parada de Orgulho LGBT, realizada ali há exatos 20 anos.

Essa seção da exposição, com 40 artistas, recobre toda a parede esquerda do primeiro andar e um dos destaques ali é o grupo 3NÓS3, visto em fotos das intervenções na Paulista, em 1979, encobrindo monumentos e impedindo o trânsito. No entanto, tudo nessa área, de cartões postais centenários aos pôsteres da Parada, está homogeneizado em molduras convencionais, institucionalizando aquilo que não tinha esse caráter.

Também é frustrante na exposição aquilo que deveria ser seu grande trunfo: as obras encomendadas a 17 artistas contemporâneos. Algumas, porque não se realizaram de fato, caso dos projetos de Renata Lucas, Marcius Gallan e Ana Dias Batista, e outras porque não chegam perto da potência que seus autores em geral alcançam.

Algumas obras, no entanto, conseguem impacto, tanto pelo diálogo com a Paulista como por sua organização no espaço, caso de Daniel de Paula e Cinthia Marcelle, para citar dois. Ambos partem de uma estratégia semelhante: recolhem objetos descartados da avenida _o primeiro refletores antigos, a segunda, pedaços de papel, para então criarem formas de exposição serializada, que trabalham com a materialidade de seus objetos.

Já Graziela Kunsch é a única a de fato trazer a confusão da avenida, nos projeções de manifestações contra o aumento de tarifa, em 2014, usadas para tratar em dos dispositivos de concreto anti-mendigo instalados no buraco da Paulista.

Mas a obra que melhor reflete a avenida é "Campo e Contra-campo", de Dora Longo Bahia. Em seu projeto original, seis pinturas suas estariam dispostas nos cavaletes de cristal do segundo andar, mescladas às obras-primas da coleção: de um lado ela iria retratar os presidentes de seis institutos culturais da avenida, de outro, cenas de violência policial em manifestações populares. Os retratos foram aprovados pelos curadores, mas proibidos pela direção do museu. A artista, então, manteve as pinturas dos versos, mas cobriu com branco onde estariam os retratos, um vazio que reflete o poder de quem manda na cultura da cidade.

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AVENIDA PAULISTA
QUANDO: ter., qua. e sex. a dom.: 10h às 17h30. qui.: 10h às 19h30. até 28/5
ONDE: Av. Paulista, 1.578, Tel. (011) 3149-5959
QUANTO: R$ 30


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