Folha de S. Paulo


CRÍTICA

Gibson filma drama moral como um diretor dos anos 1940

Da emergência como ator, no papel de Mad Max, à consolidação como diretor, com "Coração Valente", Mel Gibson sempre buscou replicar o mito do herói que cumpre seu destino à custa de sacrifícios.

"Até o Último Homem" refaz o tema do indivíduo fortalecido por uma crença que o leva a resistir a provações, tal como Jesus na controversa representação feita por Gibson em "A Paixão de Cristo".

Mark Rogers/Summit via AP
Andrew Garfield em cena de 'Até o Último Homem
Andrew Garfield em cena de 'Até o Último Homem'

O Cristo da vez é Desmond Doss, jovem adventista que obedece à risca os ditames religiosos. Em consequência de uma reação excessiva durante uma disputa com o irmão na infância, ele se interessa pelo poder médico de salvar vidas e se recusa a portar armas quando se alista no Exército na Segunda Guerra.

Gibson filma esse caso real de moral exemplar como um diretor de Hollywood faria nos anos 1940, equilibrando ação e emoção em doses calculadas, explorando os tempos dramáticos com precisão e levando sua mensagem a quem desconfia dela.

Também contribui muito a capacidade de Andrew Garfield de tornar verossímil o papel de homem comum posto numa situação extraordinária, inspirado no Gary Cooper de "Sargento York" (1941).

Seu herói frágil enfrenta desafios morais e físicos e, assim, demonstra que liberdade e verdade se completam sob a proteção de Deus.

Essa ladainha puritanista, no entanto, choca-se com o fascínio pela violência que o filme explora em longas sequências. Enquanto a mensagem na superfície se baseia na rijeza da fé e na fidelidade ao mandamento "não matarás", Doss só reafirma seus princípios à custa de rebeldia e como protagonista de um espetáculo de carnificina.

Por essas ambivalências, o filme se mostra lúcido numa era que só valoriza o poder dos super-heróis, preferindo frisar a pouca distinção entre pacifismo e belicismo, entre crença, religiosa ou ideológica, e mistificação.

ATÉ O ÚLTIMO HOMEM
(HACKSAW RIDGE)
DIREÇÃO Mel Gibson
ELENCO Andrew Garfield, Richard Pyros, Rachel Griffiths
PRODUÇÃO Estados Unidos/Austrália, 2016, 16 anos
QUANDO estreia nesta quinta (26)
AVALIAÇÃO bom 


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