Folha de S. Paulo


CRÍTICA

Competente, livro mostra fusão de espionagem e forças armadas

Faisal Mahmood/Reuters
Policiais caminham pela área onde foi morto o terrorista Osama bin Laden, no Paquistão
Policiais caminham pela área onde foi morto o terrorista Osama bin Laden, no Paquistão

Tradicionalmente agências de inteligência buscam informações via espionagem, ou mesmo pela coleta abrangente de dados públicos. Já as forças armadas têm no combate a sua principal função.

O ótimo livro do jornalista americano Mark Mazzetti, "Guerra Secreta - A CIA, um Exército Invisível e o Combate nas Sombras", mostra que, depois dos atentados terroristas de 11 de setembro de 2001 nos EUA, os espiões passaram a realizar operações militares, e os militares passaram a coletar inteligência.

É um processo inquietante pois uma das suas facetas são os "assassinatos com assinatura" contra inimigos dos Estados Unidos feitos seja através de forças especiais –como os Seals da Marinha que mataram o terrorista Osama bin Laden em 2011–, seja do cada vez mais comum uso de aeronaves remotamente pilotadas (ARPs), também conhecidas como veículos aéreos não tripulados (VANTs).

Os pequenos e barulhentos aviões sem pilotos também são conhecidos pelo apelido drone, literalmente "zangão" em inglês, e também "zumbido", que lembra o barulho que fazem essas aeronaves movidas em geral a hélice.

Mazzetti faz um bom relato da evolução das atitudes da CIA (Agência Central de Inteligência) desde sua criação em 1947 pelo presidente Harry Truman. A agência herdou parte da tradição da sua ancestral OSS (Escritório de Serviços Estratégicos), criada durante a Segunda Guerra para realizar atos de sabotagem na Europa ocupada pelos nazistas e apoiar os movimentos de resistência nos países ocupados.

De acordo com o contexto político, cada administração americana tendia a apoiar mais este lado "militante", mas potencialmente ilegal, da CIA, ou seu papel menos excitante de coleta e análise de dados. Nas décadas de 1950 e 1960 a agência agiu em vários países do Oriente Médio e América Latina para depor governos considerados antiamericanos.

A ênfase no lado operacional criou problemas pela falta de informações confiáveis. A CIA não conseguiu provar a existência de armas de destruição de massa no Iraque em 2003 (pois elas não existiam). A agência não previu a Primavera Árabe deslanchada a partir de 2010.

Mas o momento mais polêmico da sua história recente foi a institucionalização da captura de supostos inimigos dos EUA, seu aprisionamento e tortura em lugares como a base de Guantánamo, encrave americano em Cuba. Os escândalos levaram ao gradual fim dessas práticas, apenas para serem substituídas pelo uso "cirúrgico" dos drones.

Como é bem lembrado no livro, o "piloto" de um drone pode estar a milhares de quilômetros de distância. Se o inimigo conseguir abater o aviãzinho, o "piloto" vai continuar vivo e dormir na sua cama de noite em vez de se tornar prisioneiro de um país ou grupo terrorista inimigo –ou mesmo "amigo", pois este tipo de operação tem ocorrido com frequência nos céus do Paquistão, suposto parceiro dos EUA. Foi no país que Osama bin Laden foi morto.

Guerra Secreta
Mark Mazzetti
l
Comprar

O livro é competente e baseado em centenas de entrevistas e documentos, muitos ainda secretos, mas a edição brasileira é repleta de problemas que podem vir do original, da tradução ou revisão (ou da falta dela, especialmente de termos técnicos).

GUERRA SECRETA - A CIA, UM EXÉRCITO INVISÍVEL E O COMBATE NAS SOMBRAS
AUTOR Mark Mazzetti
TRADUÇÃO Flávio Gordon
EDITORA Record
QUANTO R$ 44,90 (392 págs.)
AVALIAÇÃO ótimo 


Endereço da página:

Links no texto: