Folha de S. Paulo


CRÍTICA

Anti-herói brasileiro vê a sorte virar azar em 'Curumim'

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"Isso aqui que estou fazendo é uma loucura. Mas loucura é com a gente mesmo."

Quem fala é Marco Archer, brasileiro condenado à morte por tráfico internacional de drogas e fuzilado em 18 de janeiro de 2015 na Indonésia após permanecer 12 anos no corredor da morte.

A "loucura" a que ele se refere, no entanto, não é saltar de parapente ou tentar entrar em um país que aplica pena capital a tráfico de drogas com 13,5 kg de cocaína na bagagem.

Ele se refere ao ato de filmar clandestinamente seu cotidiano num presídio de segurança máxima na Indonésia. E esta é a base do documentário "Curumim", de Marcos Prado.

Divulgação
Retrato de Marco Archer visto no documentário
Retrato de Marco Archer visto no documentário "Curumim"

O diretor de "Paraísos Artificiais" e "Estamira" foi procurado pelo brasileiro preso para que contasse sua história, do céu ao inferno, e alertasse os jovens sobre os perigos das escolhas que fez.

"Curumim", apelido de Archer, costura trechos das 70 horas de conversas dele com Prado e três horas de gravações em vídeo com dezenas de cartas endereçadas ao diretor e imagens de arquivo.

Remonta a infância no Rio, sob a guarda do pai alcoólatra, "violento como todo cachaceiro", e o acompanha até os dias que antecederam sua execução, encenada de maneira capaz de suscitar dúvidas: eram as cenas reais?

Archer, expulso 14 vezes dos colégios por que passou, ainda adolescente subia o morro Dona Marta para comprar maconha para si e cocaína para os colegas.

A partir de seus relatos e dos de seus amigos, a exitosa carreira de Archer no tráfico de drogas se revela. Após vender cocaína em Los Angeles, chefiou uma rota de skank, batizada de Lemon Juice, que escoava de Amsterdã para Bali. Seu esquema chegou a contar com mais de 50 mulas (que se arriscavam nos aeroportos levando a droga).

Morou na Europa, formou-se chef de cozinha na Suíça e se dedicou a viagens, mulheres e voos de asa-delta.

Os registros daquele tempo são cercados de amigos. Talvez por isso seja tão impactante vê-lo no presídio indonésio, entre assassinos e terroristas islâmicos, longe da família e da sua turma, apegado ao companheiro italiano, preso com a cocaína que financiaria o suborno de Curumim às autoridades corruptas do país.

A cada cena, fica a vocação do filme para o debate a partir do retrato do arrependimento de um anti-herói que subitamente viu a sua sorte virar azar.

CURUMIM
DIREÇÃO Marcos Prado
PRODUÇÃO Brasil, 2016, 10 anos
QUANDO em cartaz


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