Folha de S. Paulo


Como 'O Nascimento de uma Nação' foi de promessa de Oscar a alvo de boicote

"O Nascimento de uma Nação", que tem nesta sexta sua primeira sessão na 40ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e cuja estreia em salas está prevista para 10 de novembro, é a produção mais falada do ano nos Estados Unidos. Mas não por motivos que alegrariam o estreante Nate Parker, 36, diretor, corroteirista e protagonista da produção.

O longa –que custou US$ 10 milhões, pouco para os padrões americanos– conta a história real de uma rebelião de escravos ocorrida em 1831 na Virgínia, sul dos EUA e é provocativo desde o título, que repete o do clássico racista de D. W. Griffith, de 1915.

O filme foi aclamado pelos críticos ao vencer o Festival de Sundance em janeiro. Ganhou impulso com a polêmica dos indicados ao Oscar 2016 –que ignorou o trabalho de atores negros e gerou a campanha #OscarSoWhite (Oscar tão branco).

Criador e criatura foram apontados como os principais concorrentes ao Oscar 2017. Amazon Studios e Netflix (que teria oferecido US$ 20 milhões) brigaram pela produção, mas o cineasta assinou com a Fox, que pagou US$ 17,5 milhões pelos direitos de distribuição.

Divulgação
MOSTRA DE CINEMA O NASCIMENTO DE UMA NAÃÃO THE BIRTH OF A NATION O NASCIMENTO DE UMA NAÃÃO Nat Turner, um ex-escravo estadunidense, lidera um movimento em 1831 para a libertação dos afro-americanos na Virgínia, o que resulta em uma violenta retaliação por parte dos brancos. Vencedor do Grande Prêmio do Júri da seção filmes americanos e do Prêmio do Público no Festival de Sundance. DireçãoNATE PARKER RoteiroNATE PARKER FotografiaELLIOT DAVIS MontagemSTEVEN ROSENBLUM MúsicaHENRY JACKMAN ElencoNATE PARKER, AUNJANUE ELLIS, ARMIE HAMMER, AJA NAOMI KING, PENELOPE ANN MILLER ProdutorNATE PARKER, KEVIN TUREN, JASON MICHAEL BERMAN, AARON L. GILBERT, PRESTON L. HOLMES ProduçãoBRON STUDIOS, MANDALAY PICTURES, PHANTOM FOUR, TINY GIANT PRODUCTIONS DistribuiçãoWARNER BROS. Classificação Indicativa14 ANOS ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Nate Parker e o garoto Tony Espinosa fazem o papel de Nat Turner

Então, em agosto, tudo mudou. Uma reportagem da revista "Variety" revelou que Parker e seu amigo Jean Celestin, corroteirista do filme, haviam sido acusados de estupro em 1999, quando eram estudantes da Universidade Estadual da Pensilvânia.

A defesa alegou que o sexo foi consensual, e Parker foi inocentado. Celestin foi condenado, mas a sentença foi mudada após recurso. A reportagem também revelou que a estudante –cujo nome não foi tornado público– tinha se suicidado em 2012.

"Acabo de saber que ela pôs fim à própria vida alguns anos atrás e estou tomado por um profundo pesar", escreveu Parker no Facebook. No post, ele lamentou ainda sua falta de "sabedoria" no passado, mas sustentou sua inocência no "encontro inequivocamente consensual".

O caso afetou a percepção do público em relação ao filme, e uma operação de guerra foi armada para afastar a controvérsia. A primeira ação foi no Festival de Toronto, um mês após as revelações. A Fox Searchlight chamou para uma entrevista com Parker e elenco (sem o roteirista) cem veículos de todo o mundo, incluindo a Folha.

Parker não quis comentar o assunto: "Já falei sobre o caso e tenho certeza de que falarei novamente, mas esse é um fórum de discussão sobre o filme. Não é apenas meu. Quatrocentas pessoas trabalharam nele, não sou o dono dele, não pertence a mim. Então, não quero sequestrá-lo".

É difícil: o filme usa o estupro de duas escravas como estopim da rebelião na qual 60 escravocratas e suas famílias foram mortos. A estreia comercial nos EUA aconteceu no início de outubro e foi cercada por pedidos de boicotes de grupos feministas.

O longa rendeu só US$ 14 milhões em três semanas –especialistas calculam que o prejuízo da Fox, após os investimentos em marketing, chegue a US$ 10 milhões.

As principais publicações de Hollywood já tiraram "O Nascimento de uma Nação" das listas de candidatos ao Oscar. E Parker e seu trabalho acabaram substituídos por outro drama de temática negra, "Moonlight", de Barry Jenkins.


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