Folha de S. Paulo


Teatro Oficina remonta espetáculo 'Bacantes', a sua 'tragycomediorgya'

O concreto aparente da arquitetura de Lina Bo Bardi dá lugar a um chão de terra batida no teatro do Sesc Pompeia. O palco, agora fofo e cor de terracota, recebe a partir desta sexta-feira (21) o ritual de "Bacantes", peça que o Teatro Oficina reencena 20 anos após sua estreia. Depois de três sessões no Sesc, o espetáculo segue temporada na sede da companhia.

Última tragédia conhecida do grego Eurípedes –que teria escrito a peça aos 80 anos, durante seu exílio na Macedônia–, "Bacantes" retrata a morte e o renascimento de Dionísio, deus do teatro, do vinho e do Carnaval.

A montagem do Oficina reconta a história como num rito carnavalesco, repleto de referências brasileiras. Dionísio (Marcelo Drummond), filho de Zeus (Sergio Siviero) e da mortal Semelle (Camila Mota), retorna a TebaSP, sua cidade natal, que não reconhece a sua divindade.

Ali trava um embate com Penteu (Fred Steffen), que usurpou o governo do avô, Cadmo (Ricardo Bittencourt), e tenta impor a autoridade civil sobre os ritos orgíacos associados ao deus Dionísio. Mas o novo governante acaba estraçalhado pela mãe e pela mulher, elas mesmas adoradoras da deidade.

Como é de praxe em suas montagens, o diretor Zé Celso, 79, atualiza o texto, fazendo menções a acontecimentos recentes. Cadmo se torna aquele "que foi impichado, mas é o governador". Já Penteu é "uma pessoa que tem dinheiro, que ganha as eleições todas, um acelerado" –referência ao prefeito eleito de São Paulo, João Doria (PSDB), e seu slogan "Acelera SP".

"E quero atualizar ainda mais", comenta o encenador durante um ensaio da montagem na última quarta-feira (19). "Acho que Penteu tem que ser mais cínico, mais Doria. Ele [o personagem] representa todos os golpistas, essa onda de conservadorismo que a gente está vivendo."

VINHO E CARNE

Nas quase seis horas desta "tragycomediorgya", com dois intervalos regados a vinho e carne, o Oficina transita pelos corredores do Sesc, pelo mezanino do teatro, pelas escadas centrais das duas plateias que circundam o palco.

Remonta a outra arquitetura de Lina Bo Bardi, a do próprio Teatro Oficina. Foi "Bacantes" que inspirou o atual prédio de corredor extenso da companhia, projeto da italiana tombado pelo patrimônio histórico desde 2010.

A criação do espetáculo tem origem em 1983, quando o grupo começou a adaptar o texto a partir de traduções encomendadas do grego. Lina foi chamada para reformar o prédio no ano seguinte. Mas a peça só tomou forma mais de uma década depois e foi outra montagem, "Ham-let", que inaugurou o edifício no bairro do Bexiga em 1993. "Bacantes" só chegaria ao Oficina três anos depois.

"Compus as músicas no fim dos anos 1980 e ficou o feto [da peça] gravado em fita cassete", relembra Zé Celso.

As composições bebem muito no samba e em marchinhas carnavalescas. "Na adaptação, fomos encontrar a correspondência entre 'Bacantes' e a gente exatamente na linguagem do Carnaval, das músicas brasileiras."

BACANTES
SESC POMPEIA r. Clélia, 93, tel. (11) 3871-7700. Sex. (21) e sáb. (22), às 18h, dom. (23), às 17h. Ingr.: R$ 12 a R$ 40
TEATRO OFICINA r. Jaceguai, 520, tel. (11) 3104-0678. De 28/10 a 23/12; sáb. e dom., às 18h (dia 28/10, às 20h). Sessões especiais: qua. (2/11) e sex. (23/12), às 18h. Ingr.: R$ 20 (moradores do bairro do Bexiga) a R$ 60
CLASSIFICAÇÃO 18 anos


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