Folha de S. Paulo


Corrida de obstáculos nos remete a passado visceral de privações

Um documentário recém-lançado nos Estados Unidos anda, talvez inesperadamente, despertando enorme interesse. Seu tema não é política, guerra, crimes corporativos ou justiça social. O filme, com o curioso título "Rise of the Suffer Fests" (ascensão das festas das dores), também não é sobre o pagamento de promessas ou outros rituais religiosos de auto-imolação. O tema é esportivo. As festas das dores, às quais o título se refere, são, na verdade, corridas de obstáculos tanto para adultos quanto para crianças. Eis o link para o trailer: riseofthesufferfests.com.

No ano passado, cerca de um milhão de pessoas participou da corrida de obstáculos Spartan Race norte-americana, o dobro do número de participantes em maratonas e meia-maratonas. Em setembro, a Spartan Race estreou em São Paulo, com 1.500 participantes. Dia 23 de outubro, estreia no Rio (www.spartan racebrasil.com.br). Eu e minha esposa, uma das melhores praticantes do esporte do mundo, estaremos lá.

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Criancas competem em uma Spartan Race, corrida de obstaculos que e tema de documentario EXCLUSIVO ILUSTRADA NAO USAR ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Criancas competem em uma Spartan Race, corrida de obstáculos que é tema de documentário

O foco do documentário é simples: o que leva pessoas dos 13 aos 70 anos a participar de corridas onde têm de atravessar poços de lama, rastejar sob arame farpado, subir cordas, pular muros de 2,4 metros, sobrepujar obstáculos altos e escorregadios, subir trilhas íngremes, atravessar lagos gelados, carregar sacos de 40 quilos, baldes cheios de pedras, enfim, se submeter a um esforço físico punitivo que parece coisa de louco?

O documentário gira em torno da trajetória do seu diretor, Scott Keneally, sedentário que resolve se dedicar à atividade. No caminho, encontra atletas de elite, o inglês excêntrico que inventou o esporte e os CEOs das empresas que faturam milhões com a popularidade das corridas, como Joe de Sena, da Spartan, e Will Dean, da Tough Mudder.

As corridas representam uma metáfora para a vida. Vencer obstáculos vai além do esforço físico, necessitando uma atitude mental vitoriosa, de autoconfiança. Keneally vê, também, a importância da mídia social, com praticantes das corridas virando guerreiros de fim de semana, mostrando no Facebook ou no WhatsApp fotos de suas conquistas.

Vejo algo profundo acontecendo. As corridas nos remetem aos nossos ancestrais, que caçavam com uma resistência física que se esvaiu nos milênios. Evoluímos para isso, com nossos corpos adaptados a esforços e privações físicas gigantescas.

A vida moderna sequestrou esse nosso lado, forçando-nos a sentar por horas a fio, como faço agora escrevendo este ensaio. As corridas de obstáculos nos conectam a esse passado distante, despertando nossa essência visceral adormecida sob a rotina do cotidiano.

O documentário explora bem o aspecto revolucionário dessas corridas. Quem participa muda de atitude. É uma experiência única que acentua a intensidade da vida. Isso, eu garanto.


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