Folha de S. Paulo


Pedro Almodóvar tenta vaga no Oscar com 'Julieta' em meio a má fase

O cineasta Pedro Almodóvar, responsável por sucessos como "Volver" (2006), não vive seu melhor momento.

Seu filme mais recente, "Julieta", lançado em julho no Brasil, foi mal recebido na sua Espanha natal. A bilheteria decepcionou. O crítico Carlos Boyero, seu constante detrator, escreveu que o longa não lhe transmitia nada.

Almodóvar ainda empolga no exterior e deve ser homenageado no Museu de Arte Moderna de Nova York. Mas em seu país, que na semana passada escolheu "Julieta" como representante no Oscar, seus êxitos são questionados.

Diversos argumentos se repetem contra seu cineasta mais renomado. Diz-se que perdeu o contato com as ruas. Também se debate sua saúde, após uma grave operação nas costas e dificuldade de audição.

A divulgação, em abril, dos "Panama Papers", escândalo de evasão de impostos em que foi citado, colou seu rosto no cartaz da má fama.

Almodóvar foi acusado de ter usado uma firma que operou entre 1991 e 1994 nas Ilhas Virgens Britânicas para escapar da tributação. Ele afirma que a medida tinha por objetivo facilitar acordos internacionais e foi depois deixada.

NÃO VI E NÃO GOSTEI

Espanhóis ouvidos pela Folha dizem que preferiam nem ver "Julieta". Jornalistas da área cultural, por outro lado, defendem o artista do que veem como perseguição.

"Nenhum cineasta espanhol, exceto Buñuel, chegou tão longe internacionalmente", diz Elsa Fernández-Santos, que acompanhou as gravações de "Julieta". "O respeito e admiração que há fora da Espanha são incríveis."

Ela admira o longa, no qual identifica uma fase em que Almodóvar que não faz concessões ao público. "Julieta" narra a busca da protagonista pela filha desaparecida, entre lembranças dolorosas.

"Não é para o grande público. Em vez de se acomodar, ele faz cinema para si. É a coisa mais valente que um criador pode fazer."

Ela renega ainda a fama de ermitão. Ele é, diz, dos poucos diretores que frequentam cinemas –fato comprovado pela reportagem em Madri.

Questionado sobre o mesmo tema, Juan Cruz interrompe a reportagem. "Mas quem é a rua? Os taxistas? Que mania! E qual é a rua dos jornalistas, dos críticos? A fila do cinema? Nem pegam fila!"

Cruz, diretor-adjunto do jornal "El País", também refuta quem diz que o cineasta se repete. A repetição está presente, afinal, na obra de Velázquez, Goya, Jorge Amado e Jorge Luis Borges, enumera.

Uma das vozes mais destoantes é a do crítico Carlos Pumares, conhecido pela acidez de comentários no rádio.

Sobre "Julieta", diz não ter opinião. Afinal, não o viu. "Quando era obrigado, via os longas, mas nunca me interessaram."

Ele contesta a cobertura da imprensa local, na qual vê fascinação pelo glamour, "como o do festival de Cannes", distante do gosto do público.

Em junho, "Julieta" fez quase 570 mil entradas em 4 semanas na França. Na Espanha, em 11 semanas, atraíra só 330 mil espectadores.

"Sabíamos que seria pouco. É um drama muito duro", diz o jornalista Gregorio Belinchón. Para ele, a bilheteria de "Julieta" foi prejudicada por sua própria natureza.


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