Folha de S. Paulo


Crítica

Versão de comédias italianas é tão ruim que deveria ser vista

Pode parecer estranho recomendar um filme tão ruim, mas "Funcionário do Mês" merece ser visto, nem que seja para tentar entender o sucesso de comédias ao estilo "Zorra Total". Coescrito e estrelado pelo comediante Checco Zalone, o filme é um fenômeno na Itália, onde desbancou "Avatar" e tornou-se a maior bilheteria da história do país.

O Brasil tem seu Checco Zalone. É o cineasta Roberto Santucci, responsável por filmes como "De Pernas pro Ar" e "O Suburbano Sortudo", entre outros. Em perfil na revista "Piauí", Santucci foi descrito como o cineasta de maior sucesso comercial da história do cinema brasileiro.

Divulgação
CENA DO FILME Funcionario do mes [Quo vado, Itália, 2016], de Gennaro Nunziante (Galeria Distribuidora). Genero: comedia. Elenco: Checco Zalone, Eleonora Giovanardi, Sonia Bergamasco. Classificacao: 12 anos ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
O ator Checco Zalone em cena de 'O Funcionário do Mês'

Zalone é tão famoso na Itália que seus personagens –ele já fez quatro filmes– se chamam Checco Zalone. Em "Funcionário do Mês", ele interpreta um funcionário público que passa os dias vagabundeando. Quando o governo anuncia medidas de combate à ineficiência do serviço público, incluindo a demissão voluntária de funcionários, ele se recusa a sair. Não quer perder a boquinha por nada.

Checco encontra uma nêmese, uma chefona dura que o manda para um posto no Círculo Polar Ártico. Zalone se apaixona por uma cientista norueguesa e acaba na Noruega, onde sofre para se adaptar, com seus modos machistas, toscos e preconceituosos.

"Funcionário do Mês" é uma versão piorada das fórmulas cômicas que o cinema italiano usa há pelo menos 80 anos. Comédias italianas sempre trataram de temas como a burocracia estatal, o machismo, o abismo cultural e econômico entre o sul pobre e o norte rico, e o complexo de inferioridade em relação a outros países. A diferença está na qualidade do texto, da direção e da atuação.

Entre muitas cenas pessimamente escritas, dirigidas e atuadas, há uma que merece destaque: Zalone entra em um escritório para confrontar "o chefe", sem saber que se trata de uma mulher. Ele entra em uma sala e vê um homem e uma mulher. Imediatamente, dirige-se ao homem, e fica surpreso quando este diz que a chefe é a mulher. "Achei que ela era a secretária", diz Zalone.

A cena já não era boa, mas a frase exacerba sua ruindade. Fosse dirigida com um pouco mais de sutileza e talento, um olhar de Zalone deixaria claro seu espanto. Mas "Funcionário do Mês", a exemplo da grande maioria das recentes comédias brasileiras, não se arrisca a deixar nada à imaginação do espectador. Tudo precisa ser explicado, sem nenhuma concessão à capacidade de abstração do público.

A comédia sempre lidou com estereótipos e diferenças. O problema é como os assuntos, por mais delicados que sejam, são tratados. E a comédia italiana, com atores como Totò, Vittorio Gassman, Anna Magnani, Alberto Sordi, Aldo Fabrizi e Ugo Tognazzi, e roteiristas como Steno, Mario Monicelli, Suso Cecchi D'Amico e a dupla Age & Scarpelli, sempre falou de assuntos incômodos de uma forma carinhosa e irônica, expondo as diferenças e conflitos sem precisar explicá-los ao espectador. No fundo, o que existe é uma diferença abissal de talento.

O FUNCIONÁRIO DO MÊS (Quo vado?)
DIREÇÃO Gennaro Nunziante
ELENCO Checco Zalone, Eleonora Giovanardi e Sonia Bergamasco
QUANDO Em cartaz
PRODUÇÃO: Itália, 2016, 12 anos


Endereço da página: