Folha de S. Paulo


'The Get Down' revive origem do hip-hop com produção mais cara da Netflix

Baz Luhrmann nunca foi um diretor conhecido por tomar as decisões mais óbvias. Transformou "Romeu e Julieta" em um romance teen moderno, misturou Nirvana e Madonna com Toulouse-Lautrec no musical "Moulin Rouge!" e adaptou "O Grande Gatsby", um dos maiores clássicos da literatura norte-americana, em um filme 3D.

Em tempos de restrições orçamentárias e criativas no cinema, nada mais conveniente que o cineasta tenha se mudado para a Neftlix de mala, cuia e... picapes. Em seu primeiro grande projeto em séries, o australiano comanda "The Get Down", sobre as origens do movimento hip-hop na Nova York do fim dos anos 1970 que começa nesta sexta-feira (12).

"Me pergunto todos os dias a mesma coisa: por que um australiano branquelo inventou de fazer uma série sobre hip-hop no Bronx?", diz à Folha o falastrão e divertido Luhrmann. "Sabia que estava me metendo em um fogo cruzado, mas se vivesse com medo, não teria feito nenhum filme na minha carreira. Acho que tenho um desejo suicida."

Mas o diretor não é bobo. Cercou-se de pessoas importantes da comunidade afro-americana, vários que estiveram nas primeiras pistas de dança do Bronx em 1977.

"Vi sinceridade nos olhos de Baz quando ele me falou que gostaria de contar a história dos anos perdidos de um negócio que se tornou bilionário", diz o DJ Grandmaster Flash, um dos pioneiros retratados na série e consultor do projeto. Além dele, Luhrmann trouxe Nelson George, um escritor especialista em música negra, e o rapper Nas, responsável pelas canções originais dos 12 episódios.

Mesmo assim, o caminho não foi um mar de rosas. "The Get Down" foi anunciada em 2013 com Shawn Ryan ("The Shield") como showrunner –responsável criativo que controla texto, verba e direção– e o dramaturgo Stephen Adly Guirgis como cocriador.

Depois de quase um ano de trabalho em Los Angeles, o diretor não viu nenhum avanço nos roteiros e decidiu mudar a equipe para Nova York em busca de autenticidade. Ryan pulou fora e Thomas Kelly ("Blue Bloods") assumiu só para ser demitido alguns meses depois, já com as filmagens a todo vapor.

Luhrmann, que esperava servir como uma entidade divina no set, precisou arregaçar as mangas, dirigiu os três primeiros episódios e supervisionou com mão de ferro a coreografia e a direção de arte de "The Get Down". Por causa disso, as entregas do material bruto começaram a demorar. A Sony, que coproduziu com a Netflix, começou a ficar impaciente e a se preocupar com o estouro no orçamento.

Antes prevista para US$ 7,5 milhões por episódio, a série teve um custo total de US$ 120 milhões. Com tais números, "The Get Down" virou a série mais cara da empresa de streaming. Para acalmar os executivos da Sony e mostrar que tudo estava sob controle, a Netflix dividiu o projeto em dois segmentos de seis episódios cada –o segundo estreia no primeiro semestre de 2017.

"Eles foram elegantes comigo, não sei quanto tempo isso vai durar. O nível de ousadia, grana e colhões que há por trás da Netflix é impressionante", afirma Luhrmann.

O diretor se refere aos adolescentes que formam a narrativa central: um grupo de poetas, dançarinas e artistas do gueto que ousa peitar a moda da discoteca para formar um grupo de hip-hop. É uma linha de ficção repleta de referências reais, diálogos pomposos e números musicais que passam longe do que é feito na TV. "É uma série cara e a empresa bancou mesmo tendo um elenco composto por atores negros e latinos desconhecidos", exalta Nelson George. "Quão ousado é isso?"


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