Folha de S. Paulo


Crítica

Em livro, criador de 'Downton Abbey' retorna à era vitoriana

Desde que se atirou de um helicóptero abraçada a James Bond, durante os Jogos de Londres, em 2012, a rainha Elizabeth nunca mais foi a mesma.

Conquistada por meio de um notável esforço de marketing, a retumbante popularidade atual da monarca seria impensável no auge dos conflitos na Irlanda do Norte, nos anos 1960, ou mesmo nos 1970, quando os Sex Pistols rugiam: "Deus salve a rainha, Ela não é um ser humano".

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Upper Belgrave Street, Belgravia, London
O distrito de Belgravia, em Londres, onde a história se passa

Naqueles anos fervilhantes, o autor, historiador e roteirista Julian Fellowes ("Downton Abbey" e "Gosford Park"), com sua prosa de bisbilhotices de alcova, jamais seria levado a sério como material para "bestseller".

O "Belgravia", que ele acaba de lançar em capítulos pela internet (Dickens, a quem Fellowes gostaria de ser comparado, também serializava suas histórias em capítulos semanais publicados em revistas) dificilmente emplacaria na era punk dos recessivos anos 1970.

Fato está que, hoje, a rainha é pop. A energia outrora despendida em militância contra o sistema foi toda canalizada para o consumismo.

Assim, o baronete Fellowes (sim, ele também possui um título) aproveita a onda para discorrer sobre seu fascínio pela realeza e pelos idos de glória do falecido (ou quase) Império Britânico.

Na esteira da popularidade que a transformou na simpática vovó de seu reino, Elizabeth, e o sistema constitucional que a precede, permitem que o autor repita "ad náusea" o mesmo enredo: o embate entre privilegiados e pés-rapados e suas decorrentes tensões eróticas.

Benza Deus, esse não é seu único assunto. A Inglaterra vitoriana foi uma era sem precedentes na história, de conquistas fascinantes advindas da Revolução Industrial.

O pano de fundo do capítulo inicial de "Downton Abbey" é o naufrágio do Titanic.

Neste novo "Belgravia" –que você pode ler em capítulos via internet, ouvir baixando o app de mesmo nome ou perscrutar na forma de livro recém-lançado pela editora Intrínseca–, Fellowes ambienta a apresentação de sua história em 15 de junho de 1815, véspera da Batalha de Waterloo, no famoso baile promovido em Bruxelas pela duquesa de Richmond.

O regabofe reuniu a alta nobreza europeia para homenagear o Duque de Wellington, general britânico que, horas depois, iria neutralizar Napoleão no campo de batalha.

A intriga, a fofoca e os usos e costumes dos vitorianos serão atirados 25 anos adiante e desembarcados na exclusivíssima Belgravia, bairro londrino que foi lançado como empreendimento imobiliário de luxo nos anos 1830 pela família mais rica da Inglaterra, os Grosvenor (e talvez uma das mais nobres, posto que eles ainda detêm o título do ducado de Westminster, região central de Londres).

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A esta altura, quem nunca curtiu história de príncipe e de princesa, certamente está se perguntando: "E eu com os Grosvenor?" (pronuncia-se grouvenôr).

A estes, eu responderia: "Remember Sarajevo". Não custa, nem que seja de forma lúdica e um tanto despropositada enquanto ponto de vista histórico, tentar investigar os motivos pelos quais a Europa de hoje anda sendo tão comparada com a de antes da Primeira Grande Guerra.

Não é que o esnobe Julian Fellowes pode ajudar nas explicações?

BELGRAVIA
AUTOR Julian Fellowes
EDITORA Intrínseca
QUANTO: R$ 49,90 (368 págs.)


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