Folha de S. Paulo


'Ex-maldito', Carneiro é favorito à ABL e minimiza bolor da academia

O cabelo comprido e a irreverência farta de Geraldo Carneiro parecem não caber no fardão da Academia Brasileira de Letras. Mas ele já pode se imaginar com a vetusta veste verde.

Único inscrito, por enquanto, para a cadeira 24, o poeta de 64 anos é tido como eleito. Se a votação –ainda sem data marcada– confirmar seu favoritismo, ele ocupará a vaga aberta com a morte do crítico teatral Sábato Magaldi, em 14 de julho.

Marcos Ramos - 3.mai.16/agência o Globo
Geraldo Carneiro durante leituras baseadas no 14º livro intitulado Barras, Vilas e Amores do cantor, compositor, escritor e membro da Academia Carioca de Letras, Martinho da Vila
O poeta em lançamento de livro de Martinho da Vila, em maio

Dentre os escritores que o instigavam a entrar para a ABL estava seu grande amigo João Ubaldo Ribeiro. Por acaso, Carneiro deu uma conferência sobre Shakespeare (paixão dos dois) na Academia uma semana após a morte do romancista baiano, em julho de 2014. Aproveitou para homenageá-lo e comoveu a plateia.

A candidatura agora não é tão casual. "Já tive tantas perdas de amigos queridos que sinto falta de estar com gente que tenha um lastro de informação. Na Academia há pessoas que eu costumo pegar na estante", diz ele, vendo vantagens no chá dos imortais às quintas-feiras. "Como o meu fígado já virou abóbora, chá é um luxo."

Outro grande amigo, Millôr Fernandes (1923-2012), dedicava à ABL o melhor (ou o pior) de seu sarcasmo. "Millôr era irreverente, anti-institucional. Mas tolerava nossas diferenças. Não sei se concordaria [com a candidatura], mas poderia compreender."

Geraldinho, como é chamado pelos amigos de fé e até por quem só o reconhece pelo cabelo, nasceu em Belo Horizonte. Mudou-se para o Rio com três anos, quando seu pai, Geraldo Andrade Carneiro, aceitou ser secretário particular do então presidente Juscelino Kubitschek.

A família recebia desde o médico e indigenista comunista Noel Nutels até o conservador Jânio Quadros ("mistura de Muammar Gaddafi [ditador líbio] com Chacrinha").

Ele invoca a infância para minimizar o conservadorismo atribuído à ABL e a uma parcela dos acadêmicos, como alguns políticos.

"Aprendi a conviver com as diferenças. Meu pai era um democrata. Tinha horror ao meu cabelo, mas aceitou. Sou pouco preconceituoso."

Também tradutor, compositor, dramaturgo e roteirista de cinema e TV, Carneiro estreou na poesia na antologia "26 Poetas Hoje", organizada por Heloísa Buarque de Hollanda em 1976 e que virou ícone da dita "poesia marginal".

"A Helô me proibiu de falar isso, mas sempre achei estranha essa história de poesia marginal feita por privilegiados de classe média. Marginal da pesada era Rimbaud, que traficou armas e acabou com a vida conjugal do Verlaine."

Para marcar os 40 anos de carreira, ele publicou no fim de 2015 "Subúrbios da Galáxia", que lança em São Paulo na próxima segunda (1º).

Neste sábado (30) e no domingo, ele recita poemas e conta histórias ao lado do cantor Danilo Caymmi, amigo há quase 50 anos, em espetáculos no Sesc Bom Retiro.

SUBÚRBIOS DA GALÁXIA
AUTOR Geraldo Carneiro
EDITORA Nova Fronteira
QUANTO R$ 24,90 (brochura) e R$ 39,90 (capa dura), 200 págs.
LANÇAMENTO Segunda (1º), às 19h, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional, av. Paulista, 2073

SHOW FALANDO DE AMOR
QUANDO Sáb. (30), às 21h, e dom. (31), às 18h
ONDE Sesc Bom Retiro, al. Nothman, 185, tel. (11) 3332-3600
QUANTO R$ 15 a R$ 30


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