Folha de S. Paulo


Financiamento coletivo busca preservar biblioteca de Roberto Piva

Dado Galdieri - 27.mar.2000/Folhapress
ORG XMIT: 370801_0.tif O escritor Roberto Piva, que terá seu livro
O poeta Roberto Piva durante relançamento de 'Paranoia', em 2000

Grandes caixas de salgadinhos sabor isopor acomodam parte da biblioteca pessoal de Roberto Piva (1937-2010), dono de uma das vozes mais originais da vanguarda da poesia paulistana na última metade do século 20.

A maioria dos 6.000 tomos, contudo, está em pilhas que partem do chão e chegam a quase dois metros, encostadas em paredes descascadas. Elas são muitas —quase não há espaço para móveis ou gente nos cômodos, cujas áreas somadas chegam a 110 m².

Há duas semanas, Gabriel Rath Kolyniak, editor da Córrego, e Vanderley Mendonça, editor do selo Demônio Negro, levaram as obras para um prédio neoclássico próximo ao vale do Anhangabaú, em São Paulo —onde também estão estabelecidos um estúdio de arte contemporânea e um clube de tiro. Ao lado de Gustavo Benini, herdeiro do poeta, eles querem montar ali, via financiamento coletivo, a Biblioteca Roberto Piva.

Diego Padgurschi/Folhapress
SAO PAULO, SP, BRASIL - 18-07-2016: Retrato de Gustavo Benini, detentor do espolio do poeta morto Roberto Piva. (Diego Padgurschi /Folhapress - ILUSTRADA)
Retrato de Gustavo Benini, detentor do espólio do poeta

HERANÇA

Kolyniak diz que o autor de "Paranoia", prestes a morrer, autorizou Benini a fazer o que quisesse com seus livros, "até vendê-los como livros usados em sebos ou atear fogo".

Há, entre os títulos, poesia beat, antropologia, etnografia, artes plásticas e ocultismo —áreas que, em confluência, são a matéria-prima da poesia de Piva. Alguns itens são raridades, como a primeira edição de "Iron Horse", de Allen Gisnberg, que saiu em 1974 pela City Lights —um exemplar bem conservado pode custar US$ 500.

Também há uma cópia de "Pela Estrada Fora", tradução em português lusitano de "On the Road", de Jack Kerouac, lançado em 1960 pela editora Ulisseia.

Pela riqueza da biblioteca, Benini decidiu encaixotar os volumes. Em 2015, formou uma comissão de amigos de Piva para decidir o que fazer tanto com os livros quanto com manuscritos, textos inéditos —há ao menos dois livros não editados, segundo Benini—, cartas de tarô, tambores de xamanismo...

Surgiu a ideia de disponibilizar o acervo junto a órgãos públicos, "que, como sempre, são campeões em morosidade e desconversa", aponta Kolyniak. Por exaustão de tanto tentar outros lugares e diante das negativas, pensaram em criar uma biblioteca por conta própria.

Kolyniak e Mendonça alugaram o apartamento na São João para montar, por conta própria, a Biblioteca Roberto Piva. Pagam R$ 1.500 por mês e buscam, agora, financiar o projeto de maneira coletiva. Uma campanha em catarse.me/bibliotecarobertopiva pretende arrecadar R$ 41,7 mil para bancar os custos por um ano. Até agora, conseguiram R$ 3.700.

ACERVO DO IMS PODE VOLTAR A SP

Desde 2006, o Instituto Moreira Salles, no Rio, guarda parte dos itens do autor de "Estranhos Sinais de Saturno".

No IMS estão 65 periódicos e livros, e um arquivo que contém cerca de 270 peças entre correspondências de terceiros e pessoais, fotografias, desenhos, documentos pessoais, impressos e produção intelectual. Tudo isso pode retornar a São Paulo.

"Entendemos que o acervo deve ficar em um só lugar, portanto em São Paulo, na Biblioteca Roberto Piva", diz a assessoria do instituto. "Entretanto, isso ainda não foi formalizado."

O instituto diz ainda que a forma de devolução será acertada de comum acordo entre o IMS e Benini.


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