Folha de S. Paulo


MinC ajudou na operação da PF, diz ex-secretário de Incentivo à Cultura

Nelson Antoine/Folhapress
Agentes chegam à Polícia Federal, na Barra Funda, com detido na operação Boca Livre
Agentes chegam à Polícia Federal, na Lapa, com detido na operação Boca Livre

Titular da Sefic (Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura) na gestão de Juca Ferreira, Carlos Paiva contesta a afirmação de que houve falha de fiscalização por parte do Ministério da Cultura nos projetos do Grupo Bellini Cultural, principal alvo da operação Boca Livre, deflagrada pela Polícia Federal nesta terça (28), que investiga o desvio de R$ 180 milhões de recursos federais em projetos culturais.

A afirmação foi feita por Rodrigo de Campos Costa, delegado regional de combate ao crime organizado, durante coletiva realizada na manhã de terça na Superintendência da Lapa da Polícia Federal, na zona oeste de São Paulo.

"Quando eu cheguei na Sefic, em 2015, a gente já tinha conhecimento desse caso e encaminhado à CGU [Controladoria-Geral da União, atual Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle]", diz Paiva, que esteve à frente do braço do Ministério da Cultura responsável, entre outros, pela gestão da Lei Rouanet.

Por telefone, Paiva disse que, em 2011 —antes de sua entrada na Sefic—, o Ministério Público Federal fez denúncia ao MinC contra as empresas de Antônio Carlos Bellini Amorim por uso irregular de verba pública.

"Foi então que a gente constatou que havia documentos fraudados, projetos duplicados, declarações falsas, montagens para comprovar a realização de eventos que não ocorreram", afirma Paiva. "A gente fez esse levantamento e entregou à antiga CGU, pois é ela que tem meios de investigação, inclusive em parceria com a PF."

Ele ressalta que "o órgão para aprofundar a investigação não é o MinC, mas sim a CGU junto à Polícia Federal". "A gente inclusive esperava que isso [a operação da PF] acontecesse a qualquer momento."

Ele lembra que apenas uma amostra dos eventos aprovados na Rouanet é acompanhada em tempo real. "Mais ou menos 3.000 projetos recebem captação por ano. Com a equipe que tem, o MinC faz vistoria in loco em apenas parte dos projetos", diz.

"É um tema que eu estava tentando agilizar, pois acredito que tenha como expandir a quantidade de acompanhamentos. Estávamos no meio desse processo quando o golpe aconteceu", diz, em referência à exoneração de Juca Ferreira e sua equipe, em maio, após o afastamento da presidente Dilma Rousseff.

Paiva disse ainda acreditar que o esquema das empresas do Grupo Bellini Cultural é único. "Que eu conheça, não [há casos similares]. Eu brincava [dizendo] que é o único caso 'chave de cadeia' do ministério", afirma.

OUTRO LADO

A reportagem tentou falar com a família de Antonio Carlos Bellini em sua residência, em um condomínio de apartamentos de alto padrão, no Morumbi, zona oeste de São Paulo. Foi recebida por um dos filhos do casal, adolescente, e pela diarista.

Eles afirmaram que o empresário saiu de casa pela manhã em direção à sede da Polícia Federal, na Lapa, e não voltou. Os advogados de Belllini, Eduardo Zynger e Maria Elizabeth Queijo, passaram o dia na Superintendência da Polícia Federal e não retornaram os pedidos de entrevista da reportagem.

O advogado de Odilon Costa Filho, José Luís Oliveira Lima, também não quis se manifestar sobre a investigação e a prisão de seu cliente, que está na carceragem Polícia Federal, em São Paulo.

A assessoria de imprensa das Lojas Cem disse que a Polícia Federal esteve na empresa "solicitando documentos e informações sobre empresas que lhe prestaram serviços no âmbito da Lei Rouanet". Segundo a nota, a empresa colaborou com a busca e apreensão.

A nota acrescenta ainda que "os projetos culturais nos quais investimos foram feitos, de nossa parte, dentro da mais absoluta regularidade" e que a postura das Lojas Cem "com todas as pessoas e instituições com as quais se relaciona é de total transparência e completa lisura".

O Grupo NotreDame Intermédica, que também foi alvo da busca e apreensão nesta terça-feira, diz que os policiais federais foram até a sede da empresa para a "coleta de documentos e informações relacionados a empresas terceiras de marketing de eventos (alvos da investigação) que prestaram serviços ao Grupo NotreDame Intermédica no âmbito da Lei Rouanet".

Segundo a nota, "o Grupo NotreDame Intermédica informa que não é objeto de investigação na denominada Operação Boca Livre conduzida pela Polícia Federal e enfatiza que não cometeu qualquer irregularidade". A nota da assessoria de imprensa diz ainda que o grupo colaborou e continuará colaborando com a investigação.

A KPMG no Brasil diz, em nota, que não é objeto de investigação na Operação Boca Livre e "o fato da PF comparecer ao nosso escritório se deu pelo cumprimento de diligência para coletar documentos referentes a contratos com empresas alvos da investigação e que prestaram serviços para a KPMG no apoio a projetos culturais".

A Roldão Atacadista afirmou em nota que "contratou a Bellini Eventos Culturais para a realização de dois projetos culturais e que, na manhã de terça (28), foi requerida pela Polícia Federal, no âmbito da Operação Boca Livre, a apresentar a documentação referente a esses serviços. A empresa informa que não é alvo da operação e que já entregou à força-tarefa todos os documentos solicitados. Por fim, reforça que está colaborando com a investigação, à disposição de todas as autoridades para prestar quaisquer esclarecimentos e que não admite qualquer tipo de irregularidade ou ilegalidade em suas atuações".

As empresas Cecil, Nycomedes Produtos Farmacêuticos e Laboratório Cristália, que também foram alvos de busca e apreensão na terça-feira, não atenderam os pedidos de entrevista da reportagem.


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