Folha de S. Paulo


opinião

Escalação da Bienal de São Paulo reflete clima político do Brasil

Se fosse possível medir a temperatura política da próxima edição da Bienal de São Paulo, "Incerteza Viva", pela lista final de 81 participantes divulgada na quarta (4) pelos curadores da mostra, não há dúvida de que ela estaria do lado dos que se posicionam contra o golpe em curso no país.

Entre os novos 27 nomes divulgados encontram-se artistas como o brasileiro Jonathas de Andrade, reconhecido por trabalhos de cunho político, como a instalação "Nego Bom", exibida na Bienal de Lyon, em 2013, e que critica de forma contundente e sarcástica a harmonia racial no Brasil.

Também está entre os novos nomes a brasileira radicada em Berlim Maria Thereza Alves, reconhecida por uma obra de teor engajado e militante pelas causas indígenas e ecológicas.

Outro fator que aponta um conteúdo de preocupações sociais na mostra está na seleção geopolítica realizada pelos curadores: a maioria de nomes, observando-se os 81 participantes, é oriunda de países fora da Europa Central e dos Estados Unidos. E, mesmo entre os norte-americanos, encontra-se o fotógrafo Lyle Ashton Harris, com uma obra em grande parte voltada para Gana, na África, país que ele visita regularmente desde 2005, como professor da Universidade de Nova York.

A seleção de artistas africanos, aliás, é uma das maiores da história da Bienal. Só da África do Sul há quatro artistas, além de oriundos dos Camarões, da Zâmbia e do Zimbábue.

Outro dado inovador: mulheres são mais da metade dos nomes escolhidos.

Entre elas, destaca-se a escritora, teórica e artista multidisciplinar portuguesa Grada Kilomba, que atualmente vive em Berlim, onde desenvolve o projeto Descolonizando o Conhecimento. Outra artista anunciada é a brasileira Sonia Andrade, uma das pioneiras da videoarte nos anos 1970.

Apesar de a mostra ter um perfil jovem, grande parte dos selecionados nasceu após os anos 1970. Sonia Andrade se une a outros veteranos na mostra, como o brasileiro Wlademir Dias-Pino, um dos fundadores do poesia concreta no país, o polonês radicado no Brasil Frans Krajcberg e o cineasta norte-americano Jordan Belson (1926-2011), todos também anunciados ontem.

A 32ª Bienal de São Paulo, com curadoria de Jochen Volz e dos cocuradores Gabi Ngcobo (África do Sul), Júlia Rebouças (Brasil), Lars Bang Larsen (Dinamarca) e Sofía Olascoaga (México), ocorre de 10 de setembro a 12 de dezembro, no Pavilhão Ciccillo Matarazzo, no parque Ibirapuera.

Seu título "Incerteza Viva" não deixa de ser bastante adequado ao clima político do Brasil, ao menos no momento, já que é impossível prever como o país estará em quatro meses.


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