Movimentos de capoeira, som de berimbau e instrumentos de percussão. Um homem recebe os convidados tocando sanfona. É Macbeth.
Na montagem da peça homônima que estreia nesta quarta (20) no Centro Cultural Banco do Brasil, em São Paulo, Shakespeare se mistura com a cultura brasileira.
O espetáculo é dirigido pelo britânico Greg Hicks, que tem célebre carreira como ator da Royal Shakespeare Company. Ele veio montar a peça em São Paulo a convite da organização do Fórum Shakespeare, que realiza uma série de eventos em memória dos 400 anos da morte do dramaturgo. Mas sua vontade de dar tempero brasileiro aos textos do bardo é antigo.
Conforme contou no debate organizado pela Folha e pelo British Council na última quinta (14), o ator ouviu a música de um berimbau pela primeira vez enquanto caminhava pelas ruas de Londres, na década de 90.
Ao seguir o som, conheceu o capoeirista Carlo Alexandre Teixeira –hoje seu amigo e assistente de direção.
"O Brasil abriu minha perspectiva de Shakespeare," disse Hicks. "Estou usando os rituais e músicas daqui para escancarar seus textos."
ELENCO
Paul Heritage, professor da Queen Mary University of London e curador do Fórum Shakespeare, diz à Folha que a seleção do elenco priorizou jovens atores com fortes raízes em suas culturas. Segundo ele, o objetivo era que fossem capazes de evitar que o tom ritualístico da peça se tornasse vazio e de invocar a corporalidade exigida pela capoeira.
A produção fez uma chamada aberta que atraiu 700 inscritos. Buscavam-se intérpretes que nem fossem novatos, nem tivessem carreiras consolidadas. Também era importante que tivessem perfis variados: os nove que acabaram selecionados têm etnias diversas e vêm de sete Estados diferentes. O protagonista Cristiano Meirelles é mineiro e Carol Rodrigues, a Lady Macbeth, é goiana.
Segundo Heritage, a escolha de "Macbeth" para realizar uma montagem de Shakespeare com essas características não foi incidental.
"A Escócia da peça era, para os ingleses, uma terra estranha, tomada por magia", explica. "Os atores estão trazendo essa espiritualidade da cultura do Brasil. Shakespeare é verso, e as canções afro-brasileiras estão dando o pulso para a peça."
Para o professor inglês, que trabalha há mais de 20 anos no Brasil, o contexto político do país também dá fôlego à montagem. "Os atores trazem desse momento a paixão do debate político, em um texto que fala sobre poder e desejo de mudança."
FÓRUM
O espetáculo faz parte da programação do Fórum Shakespeare, projeto da organização britânica People's Palace Projects que também sedia outras atividades em São Paulo, além de levar programação própria ao Rio e a Belo Horizonte em maio.
Na capital paulista, haverá uma série de oficinas até segunda (25) e, durante todo o sábado (23), dia que marca os 400 anos da morte do bardo, um seminário discutirá sua obra, com a presença de atores, diretores e escritores brasileiros e britânicos.
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